quinta-feira, 31 de dezembro de 2009

A voz...

Chega num eco
vindo dos sonhos
que não conhecem barreiras
nem limites...
Chega num murmúrio de amor,
Que arde, que ferve de dor,
Chega num gemido, num rasto de alegria
Que corre nas veias,
Que grita na alma,
Que tece teias
de paixão,
de sentimento,
de ilusão..
Chega uma voz
(no silêncio de palavras escritas)
Ou quem sabe um eco,
um simples murmúrio,
ou até um gemido
sumido,
quase desaparecido
que assalta a consciência
Que enche de sentido o sentido da existência
E que faz inalar a verdadeira fragrância
desse sentimento feito de felicidade e dor
A que alguém concedeu o nome de Amor...

Pombal, 05 de Fevereiro de 2002

PONHO A MESA DE AZEVINHO

Neste mosto de Natal
Com luzes sem tal e qual
Como as que guardo da infância
Rasgo o poema num galho
Que desdobro na memória
À lareira da lembrança

É feito das minhas ondas
Que se derretem no olhar
Entre presépios desfeitos
E sinos a badalar

E na toalha de linho
D'uma avó que já não tenho
Celebro a pauta da vida
Em canto sem ter tamanho

É Hino aberto ao pulsar
D'uma Estrela sem Belém
Vai no regato do sangue
P'ró musgo da minha Mãe

Ponho a mesa d'azevinho
Com palhas de fios de lã
Com chaminés de poemas
Soltos em grãos de romã

E em jantar onde me sento
Com olhos de ver em mim
Trilho saudades do tempo
Em ceia de mar sem fim

Nozes,passas,figos secos
Licores-doces,doces-vinhos
Rabanadas,filhós,sonhos
Cantilenas de carinhos

Sapatinhos, botas,socas
Mais um madeiro a queimar
O frio da Missa do Galo
E a neve deste gelar

E no cruzar do caminho
Num alpendre sem ter nome
Um Cristo a dormir sozinho
Em Natal que foge a monte...

Maria José Praça (N.126080 da SPA)

Os imprescindíveis

Há homens que lutam um dia, e são bons.
Há outros que lutam um ano, e são melhores.
Há aqueles que lutam muitos anos, e são muito bons.
Há, porém, os que lutam toda a vida.
Estes são os imprescindíveis.

terça-feira, 29 de dezembro de 2009

Masqui ramendá unga tosco bote - poema em Patuá de Macau

Masqui ramendá unga tosco bote,
Largado na mar co ónda picánte,
Quim pôde isquecê acunga dote
Qui já dá vôs grandura di gigánte!
Pa quim buscá luz, vôs sandê candia;
Quim passá fome, vêm aqui têm pám;
Pa quim ta fuzi, susto ventania,
Vôs dá teto co paz na coraçám.

quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Picada de marimbondo

Junto da mandioqueira
perto do muro de adobe
vi surgir um marimbondo

Vinha zunindo
cazuza!
Vinha zunindo
cazuza!

Era uma tarde em Janeiro
tinha flores nas acácias
tinha abelhas nos jardins
e vento nas casuarinas,
quando vi o marimbondo
vinha voando e zunindo
vinha zunindo e voando!

Cazuza!
Marimbondo
mordeu tua filha no olho!

Cazuza!
Marimbondo
foi branco que inventou...


terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Carta-Prefácio de Couto Viana para Rodrigo Emílio

Carta-Prefácio de Couto Viana para Rodrigo Emílio

via nonas by nonas on 12/22/09
CARTA-PREFÁCIO
de António Manuel Couto Viana
Caro Rodrigo Emílio:
Deste exílio
português
que celebraste tanta vez,
venho dar-te os parabéns.
Contra o ódio e os desdéns
que te perseguem o talento,
hoje, lançam-te ao vento
da glória que mereces,
teus poemas, caudais de invectivas e preces;
sátiras de sangue
sobre quem mutilou a Pátria exangue;
os lirismos de amores
(aromas subtis de delicadas flores,
a enflorarem-te o coração);
o brado do teu não
corajoso, à nacional demência;
a resistência
e valentia
que sublimam a tua poesia;
o louvor ao herói das novas sagas,
como tu, militar em exóticas plagas.
Parabéns. Neste livro, flutuam teus versos
(quantos os desejam submersos!),
que hão-de escaldar de luz
a alma que reduz,
apontando o mais além,
a quem,
traidor, mesquinho,
quis fazer Portugal Portugalzinho.
Ao invés, tu sonhaste um alto fado,
vestido de soldado.
E a tua asa de poeta,
o teu burel de asceta
na humildade da nua solidão
recusaram o lar e o pão,
pela aleluia
da tua própria companhia.

Caro Rodrigo Emílio,
agora, em santo idílio
com Deus que te sagrou e a Virgem que cantaste,
branca rosa na haste
de Fátima dos lenços e das velas,
nunca açoitada plas procelas,
tempestades iguais aos pecados do mundo,
recebe o ser profundo,
existente na tua antologia,
nosso maior e assombroso guia.
(Também aqui saúdo quem a fez
bíblia do carácter português!).
Quem não há-de adorá-la,
evocá-la,
comungá-la,
se é o nosso pensamento em sua fala?
Templo
exemplo,
leite da nossa mãe
bebido em todo o sempre. Amen!

Sou quem busca imitar-te,
no fulgor da tua arte,
na luta sem quartel.
Perdão, se o não consigo.
Mas recolhe a admiração do amigo
António Manuel.


29 de Novembro de 2009.
In Antologia Poética de Rodrigo Emílio, págs.9/10,
Areias do Tempo Associação e Editorial, Coimbra, 2009.

domingo, 20 de dezembro de 2009

Identidade

Preciso ser um outro
para ser eu mesmo

Sou grão de rocha
Sou o vento que a desgasta

Sou pólen sem insecto

Sou areia sustentando
o sexo das árvores

Existo onde me desconheço
aguardando pelo meu passado
ansiando a esperança do futuro

No mundo que combato morro
no mundo por que luto nasço


A TI MUJER DE ALMA VIVA

PASADO EL TIEMPO HE LLEGADO A LA CONCLUSION
DE QUE NADIE PODRA ENTENDER JAMAS
EL SENTIR DE UN CORAZON ENAMORADO

CUANDO TE HIERE EL AMOR
NADA PUEDE DETENERLO

DALE TIEMPO
DALE ESPACIO

MUJER DE ALMA EN
FUEGO

ARDIENTE CORAZON
SANGRANTE
SOLO SINTIENDOLO
SABRAS QUE EL AMOR
ES SUPERIOR AL ODIO

EN EL AMOR ESTA TODO PERMITIDO

AMA CON FUERZA
AMA CON ENTREGA
AMA CON TODO
SOLO EL AMOR ES INVENCIBLE

Y YO …YO …. TAMBIEN LO SOY

Walter poeta jardinero del AMOR

sexta-feira, 18 de dezembro de 2009

Natal (poema em prosa)

via Angola: os poetas by kinaxixi on 12/17/09
Há anos, na noite de Natal, numa cubata do mato angolense, uma família de tribo indígena, em cujos corações já soara a mensagem divina através da palavra portuguesa, celebrava, na sua ingenuidade pitoresca, o nascimento do Filho de Deus, à maneira da civilização cristã.

Havia uma nota originalíssima no figurativo quadro clássico. Ao canto da cubata estava construído um pequeno presépio feito de adobe, com capim e folhas de palmeira, com os reis magos e pastorinhos e, deitado em esteira de mabu, o monandengue Jesus, boneco feito de pau, pintado de preto.

Eis o milagre do amor no Natal de Cristo.
Há vinte séculos Jesus Cristo nasceu, numa manjedoura, em Belém de Judeia. Mas todos os anos através dos tempos, neste dia, ele nasce nos palácios sumptuosos e choupanas da Ásia, nas vivendas ricas e casinhotas da Europa, nos arranha-céus colossais e bairros pobres das Américas, nas cidades e vilas da África, sob a música dos sinos e das harpas, e já nas sanzalas típicas da África Negra, ao som dos quissanges e marimbas.
Na sua materialidade exótica, aquele quadro da cubata revelava a verdade eterna do espírito, não ofendida nem falseada: Jesus nasce no coração de cada ser humano, em todos os povos e raças, porque Ele é, milagrosamente, o Deus-Menino de toda a gente.

quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Poema de Luto Pesado por Rodrigo Emílio

via nonas by nonas on 12/14/09
(Em memória e louvor do Tenente-Coronel
MAGGIOLO DE GOUVEIA e de mais sessenta
PORTUGUESES, fuzilados em TIMOR pelos
facínoras comunistas da Fretilin)

Para o Pedro Rocha, a quem este poema e
respectivo autor tantíssimo devem...

Tu viste, do céu?...
Assististe, Senhor,
à chacina de Ailéu
(algures, em Timor)?!...

Viste a morte cruenta
e sangrenta
— tal como aquela que se dá às rezes... —
que sofreram 50 ou 60
Portugueses?!...

Viste como esses perseguidos
se persignaram, em português,
por môr de Dili
— e à hora da morte, unidos,
ali ajoelharam,
uma última vez
diante de Ti?...

E viste, viste também
(à flor da ilha que lhes foi berço
e lhes foi cova duradoura),
como todos, em côro, rezaram o terço
a Tua Santa Mãe,
Nossa Senhora?!...

Não deixaste sequer de reparar
que, mal a oração final
por ali se pronuncia —
eles, todos, em coral,
desataram a cantar
ao Coração Virginal
de Maria!...
... ... ...

Finalmente,
puseram-se de pé.

E à frente
de tão nobre gente,
há então quem dê
um último e ardente
testemunho de fé.

É o Tenente-Coronel
MAGGIOLO DE GOUVEIA
— que não cura de salvar a pele,
mas a epopeia!

Em nome de todos, disse isto,
Senhor!,
às fardas cruéis
que os iam matar:

«Morremos por CRISTO
e por TIMOR.
Podeis
disparar».

Rodrigo Emílio

In Poemas de Braço ao Alto, págs. 98/99.

quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

As Belas Meninas Pardas

via O Lupango da Jinha on 12/15/09

AS BELAS MENINAS PARDAS

As belas meninas pardas
são belas como as demais.
Iguais por serem meninas,
pardas por serem iguais.

Olham com olhos no chão.
Falam com falas macias.
Não são alegres nem tristes.
São apenas como são
todos dos dias.

E as belas meninas pardas,
estudam muito, muitos anos.
Só estudam muito. Mais nada.
Que o resto, trás desenganos>>>

Sabem muito escolarmente.
Sabem pouco humanamente.

Nos passeios de domingo,
andam sempre bem trabajadas.
Direitinhas. Aprumdas.
Não conhecem o sabor que tem uma gargalhada
(Parece mal rir na rua!...)

E nunca viram a lua,
debruçada sobre o rio,
às duas da madrugada.

Sabem muito escolarmente.
Sabem pouco humanamente.

E desejam, sobretudo, um casamento decente...

O mais, são histórias perdidas...
Pois que importam outras vidas?...
outras raças?... , outros mundo?...
que importam outras meninas,
felizes, ou desgraçadas?!...

As belas meninas pardas,
dão boas mães de família,
e merecem ser estimadas...

sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Memória. faria hoje 72 anos ...

via As Causas da Júlia by juliacoutinho@gmail.com (Júlia Coutinho) on 12/7/09
(7.12.1937 - 18.1.1984)


Meu Camarada e Amigo
Revejo tudo e redigo
meu camarada e amigo.
Meu irmão suando pão
sem casa mas com razão.
Revejo e redigo
meu camarada e amigo

As canções que trago prenhas
de ternura pelos outros
sem das minhas entranhas
como um rebanho de potros.
Tudo vai roendo a erva
daninha que me entrelaça:
canção não pode ser serva
homem não pode ser caça
e poesia tem de ser
como um cavalo que passa.

É por dentro desta selva
desta raiva deste grito
desta toada que vem
dos pulmões do infinito
que em todos vejo ninguem
revejo tudo e redigo:
Meu camarada e Amigo.

Sei bem mas mós que moendo
pouco a pouco trituraram
os ossos que estão doendo
àqueles que não falaram.

Calculo até os moinhos
puxados a ódio e sal
que a par dos monsos marinhos
vão movendo Portugal
- mas um poeta só fala
por sofrimento total!

Por isso calo e sabejo
eu que só tenho o que fiz
dando tudo mas à toa:
Amigos no Alentejo
alguns que estão em Paris
muitos que são de Lisboa.
Aonde me não revejo
é que eu sofro o meu país.

José Carlos Ary dos Santos, in «Resumo»

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Poema calado

Vou fazer prá você
um lindo poema,
sem letras, sem til,
sem acentos ou trema.

Poema de olhares,
sorrisos e acenos;
alguns tão doces,
outros obscenos.

Poema de risos,
perfeita harmonia,
tão belo na forma,
só pura alegria.

Poema sem falas,
de olhares constantes,
invadindo teu ser
à todo instante.

Agora, abra a alma
e receba então
o poema calado
do meu coração.

Fonte: Recanto das Letras em 21/07/2007 - Código do texto: T574269

Vontade de Deus

via Banco da Poesia by cdeassis on 12/3/09

Se é vontade de Deus
Eu ser um pingo de chuva
Na esquecida sonolência
Dum rastro d'onda perdida
Eu ser eco ou ser brisa
Ser suspiro ou ser grito
Ou ser uma estrela cadente
Morrendo no infinito…

Se é vontade de Deus
Eu ter de lutar, de gemer,
E de sentir o que sente
O dia fugindo desfeito
Nos dedos frios da noite…

Se é vontade de Deus
Eu ser una ou ser múltipla…
Ser segundo, hora ou dia…
Ser raiz feita flor
Ou ser um caminho aberto
Por onde os pobres desfilam,

Esse será o meu destino
E será minha ventura…
Porque aquele que procura
E anseia por um além
Encontra sempre um bem
No mal que a vida tem.

Um Poema de Olhares

I
Tenho papel, tenho caneta
Mas não me apetece escrever
e… preciso, preciso tanto
Fazer um poema
Um poema sem escrever.

Para quê papel?
Para quê caneta?
O papel tem que se guardar
Por vezes, esconder
Tem-se medo de o perder
Ah, cria nervos!...
E a caneta?
Pesa, incomoda!
Para quê tanta preocupação?

II
É mais prático
E duradoiro
Fazer-se um poema sem palavras
Um poema de olhares
De um olhar longo e dengoso
Ou de olhares pequeninos e furtivos.
Silenciosos…
Tímidos e envergonhados.

Uff, que bom!...
Não há papel, não há caneta, não há palavras
Apenas silêncios e olhares!...

Que me leiam
O poema que escrevo
Pelos olhares que faço.

E em troca do meu fazer
Eu quero
Que leiam o que escrevo
Com os olhares que me fazem
Também eles longos e dengosos
Pequeninos e furtivos.
Silenciosos…
Tímidos e envergonhados.

Rui Moio, elaborado a 19Nov09, pelas 12h00, no Sabores do Parque, no Hospital Júlio de Matos, Lisboa

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Um grande amor

Um grande amor

via Fernanda de Castro by António Quadros Ferro on 12/1/09

Um grande amor não cabe em nenhum verso,
como a vida não cabe num jardim,
como não cabe Deus no Universo
nem o meu coração dentro de mim.

A noite é mais pequena do que o luar,
e é mais vasto o perfume do que a flor.
É a onda mais alta do que o mar.
Não cabe em nenhum verso um grande amor.

Dizer em verso aquilo que se pensa,
ideia de poeta, ideia louca.
Não é bastante a frase mais extensa,
diz mais o beijo do que diz a boca.

Ninguém deve contar o seu segredo.
Versos de amor, só se os fizer assim:
como os pássaros cantam no arvoredo,
como as flores se beijam no jardim.

Que verso incomparável, infinito,
feito de sol, de misterioso brilho,
poderia dizer o que, num grito,
diz a mulher quando lhe nasce um filho?

E quando sobre nós desce a tristeza,
como desce a penumbra sobre o dia,
uma lágrima triste e sem beleza,
diz mais do que a palavra nua e fria.

Redondilha de amor... Para fazê-la,
desse-me Deus a tinta do luar,
a candeia suspensa de uma estrela
e o tinteiro vastíssimo do mar.

Fernanda de Castro - Jardim, (1928)

A minha sina

A minha sina

via Angola: os poetas by kinaxixi on 12/1/09
É sem norte a minha vida,
e n'um mar revolto vivo;
escravo de dura lida
eu sou a tudo captivo;
atraz do ignoto corro,
e na lucta eu soffro, eu morro

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

SE FORES À FONTE, LISBOA !

Sentei-me à mesa do fado
Embriaguei-me de mim
Deitei-me em pontos finais
Entre memórias de cantos
Soluçando mares de prantos
À vela dos meus sinais

Não me levaram de mim
Que o Fado não é assim
Não vai indo nem vogando
É impressão digital
É A -Dê -Ene fatal
Que finge a fingir que é dor
A dor que vai na corrente
A dor que deveras sente

Se fores à fonte, Lisboa
Bebe a água dos meus ais
E no manto do teu rio
Escreve o meu cantar a fio
Com retinas soletradas
E ondas enrodilhadas
No tempo do teu navio ...

mariajosépraça. (N.126080 da SPA) -Setembro 2009 -

O silêncio não tem palavras

O silêncio não tem palavras.
Mas fala mais do que muitas palavras.
Nem sempre. Às vezes.
O olhar não tem voz.
O olhar não tem palavras.
Mas também fala mais do que muitas palavras.
Nem sempre. Também só às vezes.
Basta calar a voz.
E o silêncio fala.
Basta condensar uma frase numa lágrima.
E o olhar fala.
Sim, quantas vezes se fala sem falar,
Sem usar a voz,
Usando o silêncio,
Usando o olhar...
E quantas vezes falamos sem querer falar,
Tão simplesmente com o olhar?
Quantas vezes pronunciamos o que não queremos
Tão simplesmente com o silêncio que fazemos?

Pombal, 17 de Outubro de 2001

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