quinta-feira, 31 de julho de 2008

Página Marcada

Folha de hera perdida,
a marcar a página das horas
que não findaram,
no bate-compasso-certo, da Vida!

Folha de hera perdida...

Por causa de ti,
o livro abriu-se na página marcada...
e os versos falaram de destinos belos
confundidos,
tão incertos,
mas tão sentidos.

Folha de hera,
verde-triste,
verde-escura,
a envelhecer com doçura...

Só a página dos versos
e dos meus anseios,
é sempre a mesma, marcada,
aberta no mesmo sítio,
crucificada em teus veios...

Folha de hera! Folha d' hera!...
Mesmo que o vento te leve,
será sempre Primavera...

Mesmo que o vento te leve,
o livro se encherá sempre
duma presença encantada...

E se abrirá sempre, sempre,
nessa página marcada!..."

Fonte: Blogue "Lupango da Jinha" de 29Jul2008

quarta-feira, 30 de julho de 2008

A Caminho

Vai Amigo...
Vai, e não esperes por mim...

Ao longe, fica a estrada,
talvez certa,
talvez bela.
É tua esta jornada.
Já passas a cancela...
Porque olhas para trás?...
Vai Amigo...
Amanhã, voltarás.

É longo o meu adeus.
Estão tristes os meus olhos.

Por tudo,
eles me estão tristes
neste fim...

Mas vai,
que a hora é breve...

Não esperes por mim...

Fonte: Blogue "Lupango da Jinha" - post de 30Jul2008

Angola é Nossa

Senta-te aí camarada e ouve esta canção. E, leva-a aos teus filhos e aos teus netos e aos amigos novos que não sabem como era Portugal!
Imagina, camarada, que a nossa Pátria ainda existe... Tem esperança que um dia ainda vamos ter de novo o Nosso Portugal, o único que existe e que é o que vai do Minho a Timor.
Rui Moio

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Para MACONGE

Neste reino de sonho e fantasia
Com ideais eternos de amizade
Que ninguém altere nunca a harmonia
Da lealdade e afecto de verdade.

Nossa saudade é bela, é de alegria
Os que se ausentam vivem em pensamento
Por nossa terra de além-mar em nostalgia
Não choramos pois está em nós cada momento.
Marcadores: 2008, Jovita Nóbrega

Fonte: Blogue "PoeMaconge"

domingo, 27 de julho de 2008

Trecho de (...) Sertão em Flor

Vassuncês diga o que é

Vassuncês diga o que é
Um coração de home véio
Que quanto mais véio fica,
Mais aprecia uma muié!

Vassuncês ri? Falo sério.

O coração do home véio
é um burro véio trotando,
dáqui e dali trupicando
na derradeira viage,
que faz lá prô cimitério,
comendo pelos caminhos
um resto seco de espinho
que vae topando no chão ,
bebendo uns pingo de orváio
dos óios – as duas cacimbas
da fonte do coração! ....

Em riba dúma cangáia
duas muié carregando
cum o peso todo da idade:
uma, já morta: a Esperança,
outra, inda viva: a Saudade,...

Até cair cum a Esperança
e o cadáver da Saudade
e os frutos podre dos anos
que ele leva no jacá,
prá arrecebê, afiná,
o beijo de amô da boca
da namorada dos véios,
que toda mágua alivia,
que toda a pena consola!...
A Morte, patrão, a Morte!
essa cabloca fié!
Muda... Surda...Cega e fria,
que depois de uma viola,
é a mais mió das muié.

Fonte_ Grupo Yahoo Observatório Sociológico - post de Rui Mendes de 27Jul2008

sábado, 26 de julho de 2008

O Feiticeiro do Nameculungo

via PoeMaconge by noreply@blogger.com (José Jorge Frade) on 7/25/08
Gente, oh! incrédula gente!
das margens deste Arade:
vós que hoje me chamastes
por vontade de Soba crente,
aqui voluntário me tendes,
mais do que por bondade.

Venho à Ceia de Maconge,
não costumo ser convidado;
sou estranho e amaldiçoado,
mas é estreia. Venho de longe...

Venho de terras longas, distantes.
Lá, onde abundam os imbondeiros gigantes;
lá, onde guardam mistério os elefantes,
podeis me encontrar...

Perto do grande rio do Sul,
num oco tronco me abrigo da noite fria.

Não temais a solidão, nos dias quentes da procura.
Chegados, vereis que o tempo vos sobra...

Aqui, os tempos são eternos, para longas caminhadas...
Logo entenderão, porque a velha Gagula de Sabá era minha tia...

Oh! incrédula gente! Gente sem fé!
Vinde, como Duparquet veio;
caminhai comigo ao longo do Cunene,
descalços, até onde as grandes águas se estreitam entre rochas,
e aí repousai, meditando...

Aguardai pelo ocre do ocaso, pela vertigem das cores...
Ouvi ao longe o batuque dos vossos corações...

Suku Yanguê!

A Marcelírica: poema de Tomaz de Figueiredo e de Goulart Nogueira

via nonas by nonas on 7/25/08
Marcelo José das Neves,
Das Neves Alves Caetano.
Das Neves rima com greves
E Caetano com magano
E José, José, José
Rima bem com cambapé
Cambapé é uma rasteira
Igualzinha à tua asneira
Quiseste passá-la ao Botas,
Mas só achaste derrotas.
Apoiaste o reviralho,
Ó meu cara de trabalho,
Aumentaste a confusão,
Foste um doce pré traição.
Marcelo, mar de marmelo,
Marmelada de chinelo.
O chinó pré-contrabandista
Pré careca comunista.
Mais vale sê-lo, mais sê-lo
Que parecê-lo, Marcelo!
E tu, tens de cor velha,
Puseste a sala vermelha.
E selo, leva-o tu
Com pontapés no -ú-ú-ú
Sabes com que rima Alves?
Rima, Caetano, com talves.
Talves te espremas, marmelo,
Meu vento pífio amarelo.
Talves te sumas, ó Neves
Marcelo José das greves.
Talves te mirres, marmelo
Talves te rasgues, Marcelo,
Talves te cosas, ó Alves
Talves te escorras, talves,
Ó chupista ambicioso,
Ó presuroso inditoso,
Oportunista grevista,
O que tu queres é alpista.
Já te conhecem, Marcelo,
Melro de bico amarelo,
Ó candidato a chefinho,
Caneca de água com vinho.
Meu meias-tintas, bufão,
Catão-cotão, aldrabão.
Ó Neves, ó Neves, ó Neves
Dos graves modos, das greves,
Vê a asneira que cometes!
Não paras nessas retraites.
Tu vais caindo, caindo.
E vais aí ter! Que lindo!
Talves te desfaças todo,
A abrires-te desse modo.
Talves, talves, talves, talves.
Das Neves Marcelo Alves
Ó Alves José das Neves,
Alves Caetano das greves,
Marcelo Neves José
Lava a cara no bidé,
E onde hás-de lavá-la tu,
Ó Neves cara de Ubu?
Já te chamaram terrífico
Os que te chamam magnífico.
Hoje é a traição que te invoca,
Marcelo galinha choca.
Cacareja, à estudantada!
Que grande cacarejada!
Do arejo sai um odor
Cada vez pior, pior.
É cheiro russo e vermelho
E chamusco de chavelho.
É cheiro de foge o pé,
De escorregar, José,
De José Alves Marcelo,
E de foice com martelo,
De José Alves Caetano
De ratazana de cano
De Caetano Alves das Neves,
Dos passos falsos e breves,
Das breves podres carreiras,
Das moscas e das asneiras.
Carreiras ou correrias
Pra nos trazer porcarias,
Pra nos trazer – o doutor! –
Este cheirete, este odor.
Ó Caetano Alves das Neves,
Marcelo José das greves,
Das Neves Alves Caetano,
Ó Alves José do engano,
Marcelo, burro com sela,
Tóchinha, pequena vela,
Toucinho, magro presunto!
Marcelo cheira a defunto,
Marcelo cheira a grevista,
Cheira a peste, cheira a pista.
Depois de posta mamada,
Pões as mamas de criada,
Vais servir o comunismo,
Marcelo José Cinismo,
Marcelo José Compota,
Meu marmelada, anedota.
Pata, pita, peta, pé,
Marcelo Alves José,
Marcelo José Caetano,
Caetano José marçano,
Tanto importa, tanto faz,
Dito da frente pra trás,
Dito de trás pra diante,
É sempre o mesmo tratante.
Caetano José das Neves,
Castanha chulé das greves,
Alves Caetano Marcelo,
Alças de pano de adelo,
Das Neves Alves Caetano,
Comes-e-bebes, tutano,
Tétano, Alves e Calvos,
Marcelo, mas de papalvos,
Marcelo, chá de macela,
Macela, massa, mistela,
Maçudo, um, mamarracho,
Maço, mula, mala, tacho,
Alves Caetano das Neves,
José Marcelo das greves,
Marcelo Caetano Alves,
Talves que te sumas, talves.

Tomaz de Figueiredo e Goulart Nogueira.

sexta-feira, 25 de julho de 2008

Pregões de Lisboa

Manhã cedo. O Sol dourado
A tudo vai dando cor;
Há já vida na cidade,
Já nela se ouve rumor

Vendedores ambulantes
Começam a aparecer.
Vamos lá ver, ó freguesas,
O que trazem p’ra vender

Oito horas. À nossa porta
Passa agora a tia Chica.
Com sua voz compassada
Apregoa: “Fava rica”.

Lá vem também a peixeira
Com seu trajo pitoresco,
Dizendo: “Oh ! vida da costa”
Ou então: “Carapau fresco”.

E agora, de toda a parte
Se ouve gente que apregoa,
Gritando : “Quem quer laranja,
Quem compra laranja boa ?”

"Merca o cabaz de morangos ...”
“Século. Noticias. Voz ...”
“Oh ! boa amora da horta ... “
“Quem quer amêijoas p´ra arroz ? “

“Erre,Erre, mexilhão ...”
“Oh! Pescadinha marmota ...”
“Compra raminho de flores ...”
“Oh ! figos de capa rota ...”

E com a lata no braço,
Fresquinha qual fresco arroio,
Passa a linda vendedeira,
Cantando : Oh ! queijo saloio ...”

E tudo lá vão deixando,
P’la cidade, os vendedores.
Mas, para ganhar a vida
Que canseiras, que suores !

Lupango da Jinha - post de 24Jul2008

Lua

Entre a terra e os astros, flor intensa.
Nascida do silêncio, a lua cheia
Dá vertigens ao mar e azula a areia,
E a terra segue-a em êxtases suspensa.

Lupango da Jinha - post de 24Jul2008

quinta-feira, 24 de julho de 2008

Só até o Algarve

via nonas by nonas on 7/24/08
SÓ ATÉ O ALGARVE

Caminhemos com decência,
E não em passo de alarve:
Vamos com V. Exª.
Mas somente até o Algarve…

Há distâncias desmedidas;
Não fomos feitos p`ra elas…
Não estamos para corridas,
A querer caçar estrelas.
Terra-a-terra, e não pivetes
Temos muita previdência.
Deixemo-nos de foguetes:
Caminhemos com decência.

Há p`ra aí boca taurina
E há pernaltas! – Só p`ra mofa… –
Nós temos a boca fina,
A perna curtinha e fofa…
Não somos galgo novato,
Nem um cavalo que escarve.
Nosso passo é moderato
E não o passo do alarve.

Temos os foles cansados;
Pode faltar-nos o ar…
Encargos muito pesados
Não pudemos sustentar.
Florir nas terras maninhas
É contra a nossa potência.
Para vénias… palmadinhas…,
Vamos com V. Exª.

Dar um giro cá na quinta
- Até faz bem à saúde!
E pôr ovos que dão tinta
De um oiro que nos ajude…

Depois saem pintainhos,
Brasis fora desse alarve…
Somos muito jeitosinhos,
Mas somente até o Algarve.

Goulart Nogueira - Poema inédito

terça-feira, 22 de julho de 2008

Hino de Maconge

via PoeMaconge by noreply@blogger.com (José Jorge Frade) on 7/21/08
Nobre Reino de Maconge
És um berço só de heróis
Vossos feitos vão já longe
Irradiando mil sóis.

Todos os teus nobres filhos,
Sangue da mais pura raça,
Abrirão novos trilhos
Para uma geração que passa.

Pela força dos nossos braços
Conquistaremos o Mundo
E lançaremos traços
De um civismo profundo.

E nos dias que virão
Os livros da nossa história
Terão folhas de emoção
De virtude e de glória.

Somos fortes e valentes
E jovens mui destemidos
Estamos na força bem crentes
E julgamos ser escolhidos.

Para vencer tudo na Terra
Sem vacilar, sem temor,
Pois sendo grandes na guerra
Mais o somos em amor.

Aqueles Que Por Obras Valerosas Se Vão Da Lei Da Morte Libertando

via PoeMaconge by noreply@blogger.com (José Jorge Frade) on 7/21/08
Doutor Diogo Mourão Garcez Palha
Médico, amigo, cirurgião
Perdoem-me se a memória falha
Tinha voz sonante, como um trovão
Não morreu, diz comigo a maralha
Está vivo com o bisturi na mão
Lá em cima, no Céu, onde trabalha
Outros é que estão mortos cá no chão.

Esse Céu que para nós quer dizer
Algures em parte incerta sempre estar
É forma de Maconge responder
E o mistério da vida eternizar
Perdoem-me os que não querem crer
Partir é continuar a viajar
Pois se isto não estivesse a escrever
Como é que vos iria explicar?

O César da Silveira abriu caminho
E o Mendonça das Forças se seguiu
O Saraiva foi quem mostrou o ninho
Que do Mucúfi e Mapunda surgiu:
O garboso rio Tchimpumpunhino
Que pró Ruacaná se dirigiu
Recordo também o Doutor Higino
Que aos seus alunos as portas abriu.

E são estas memórias gloriosas
Dos amigos que vamos recordando
Cujas actividades engenhosas
Vão a nossa memória dilatando
Em hospitais e escolas tão briosas
Onde nós, candengues, fomos andando
"Aqueles que por obras valerosas
Se vão da lei da Morte libertando".

domingo, 20 de julho de 2008

Na Ceia de Maconge

via PoeMaconge by noreply@blogger.com (José Jorge Frade) on 7/20/08
I
Pedi aos deuses da Mitologia,
Implorei protecção das musas belas
E Vénus disse que me socorria,
Dando-lhe a Inspiração de mil estrêlas;
Júpiter também disse que me abria
Do seu castelo as portas e as janelas,
Concedendo-me assim lá de tão longe
Falar ao rei sublime de Maconge.

II
Eu, confiado espero ter a sorte
Daquela inspiração que é meu desejo,
Se não naquele reino haverá morte,
Haverá maldição... haverá pejo,
O Olimpo sofrerá um duro corte
Porque Vulcano enfim terá o ensejo
De alastrar tal incêndio temeroso
Que até o deus dos deuses põe temeroso.

III
E Marte em quem a esperança mais palpita
Despejará também enormes lanças
Na própria residência onde ele habita,
Ver-se-ão fugir as deusas e crianças
E lacrimosa a face tão bonita
De esbeltas musas, meigas e tão mansas...
E até Baco medroso e com espanto
Deixará o Olimpo e o vinho a um canto.

IV
Nereidas, dai-me pois o vosso auxílio
E concedei-me os méritos de um monge
Para poder entrar no domicílio
Onde se encontra o reino de Maconge;
Dai-me uma inspiração como no exílio
O que canta saudades lá de longe
P'ra que ou possa p'r'o reino Macongino
Ser amplo na ideia... ser ladino.

V
Eu falo ao rei e à grande corte inteira,
Ao trono de Maconge cuja c'roa
É de D. Caio César da Silveira,
E a toda sua gente, gente boa;
Vou exaltar-lhes de qualquer maneira
A sua obra que não gira à toa,
Vou recordar passagens do reinado
E alguma coisa que já tem passado.

VI
Oh nobres e varões do grande império
Que os povos de tão longe receberam:
Gente do novo Ulisses culto e sério
Que nunca o vosso trono esqueceram,
O vosso nome chega até ao etéreo
E as conquistas que nunca pereceram
Também são conhecidas não pequenas
Por raças amarelas e... "morenas".

VII
Bem sabemos que sois conquistadores,
Pois vossa fama voa pelo mundo,
Conhecemos os feitos sedutores
E o vosso heroísmo tão profundo.
Vos sois ainda mais nobres e maiores
(Porque muito bem sei em que me fundo)
Do que muitos guerreiros triunfais
Porque vós além deles, fazeis mais.

VIII
Tende um pouco de afecto e de carinho
Nas conquistas que são tão violentas,
Vosso dardo atirai-o devagarinho -
Não vá ele fazer feridas sangrentas,
E, se puderdes, cacem o "pombinho"
Evitando outras cenas mais cruentas,
Pois nós temos por um dom mitológico
Licença p'ra fazer jardim zoológico.

IX
E se os meus rogos não possam mover
Do vosso trono tanta majestade,
Deixai-nos qualquer caça p'ra abater
Pois o filho de Ulisses tem saudades
Daquilo que ele não pode esquecer,
Mesmo quando já tenha longa idade,
E vereis que vos deixamos espantados
Por sermos como vós uns bons soldados.

X
Como na corte Olímpica existe
Na vossa une olhares meigos e amenos
Que a tentação não pode... não resiste
De se prender por certos ares morenos,
Nenhum de vós tem um aspecto triste
Ou gesto de alegria ainda pequenos
Pois até o soberano, ouvi dizer,
Por estes arredores se quis perder.

XI
E não sei se por mal ou por verdade
É fama que outros entes maconginos
Vagueiam altas horas p'la cidade
Como doidos e autênticos p'regrinos
E outros enfim que buscam a saudade
Num desabafo entregue aos seus destinos,
Apenas com um olhar sentimental
Mostram do coração o grande mal.

XII
E de noite melancólicas canções,
Que têm qualquer estro domador,
Junto das musas mostram afeições
Do vosso reino tão conquistador.
O próprio rei não falta nos serões
Entregues ao domínio do amor
E essas musas e moças que são belas
Sentem paraíso nas janelas.

XIII
Com certeza que Vénus ofertou
Ao vosso reino nobre dom amoroso
E tanbém com certeza que implorou
A protecção de Júpiter grandioso,
Pois Cupido por vezes já chorou,
Apesar do seu reino ser pomposo,
Porque Maconge a ele já suplanta
No amor que a sua corte tão bem canta.

XIV
Óh Maconginos felizes ofertai-nos,
Ao povo que eu represento e está longe,
Oh rei poderoso que és tão grande pai
(Como Júpiter no Olimpo és em Maconge)
Ofertai-nos também musa e dai-nos
O poder, a graça e um ar que não foge
De nos dar os motivos e direitos
De sermos, como vós, senhores perfeitos.

XV
Pois breve está de nós a nossa ida
P'ra outros sítio, p'ra outras regiões
E não temos sequer lembrança querida
Que mais tarde dê luz aos corações -
Apenas uma hora inesquecida,
Horas que vão passando aos trambolhões
Marcam enfim qualquer recordação
Como de tarde a branda viração.

XVI
Nós queremos, Maconginos, que uma sorte
Florida e de mil cores vos vá cercando,
Já que nós somos barcos em ter norte
A vaguear nas ondas, como errando;
Nós também queremos que essa feliz corte
Cada vez melhor se vá orientando
No sentido da busca mais feliz
E de outras coisas que aqui não se diz.

XVII
Vamos deixar-vos por cerca de um ano,
Curta separação... pequena ausência
Que pode ser o tempo de um engano
Ou tempo de obter muita experiência,
Pois durante esse tempo um bom humano
Pensamento não esquece esta excelência,
Onde viemos ter, como em romagem
E onde vimos boa camaradagem.

XVIII
Quando voltarmos, pois sempre aqui virão
Como sempre os nossos representantes -
Do nosso polo, da nossa habitação -
Terão neles amigos concordantes
Que em chegando a esta ignota região,
Em alegria - feras incesantes,
Já conhecem o seu belo destino
Privando com o reino Macongino.

XIX
Acabo com os votos mui leais,
Oh rei César Silveira, óh corte inteira,
P'ra que as felicidades sejam mais
E p'ra que a corte seja prazenteira
De nobres elementos tão reais...
E p'ra que em tudo, de qualquer maneira,
Se conheça distante, perto ou longe
Que aqui triunfa o reino de Maconge.

Macongíadas - Canto Primeiro

I
Os feios e galãs assinalados
Que em macongino reino agora existem,
Nunca deixam de andar apaixonados
E apesar das tampadas não desistem
De as asas arrastarem excitados,
Pois conseguem aquilo em que persistem,
Entre as moças bonitas alcançaram
Novas façanhas que todos espantaram.

II
Não são só as conquistas amorosas,
Que aos corações vão dando a alegria,
(Se o mundo é para eles um mar de rosas
E aquelas são o pão de cada dia)
Mas também as serenatas maviosas
Dessa gente de heróica valentia.
Tudo direi de forma bem sucinta,
Se me chegar papel, engenho e tinta.

III
Cessem de americanos as ideias
De terem as mulheres mais bonitinhas,
Temos, é certo, algumas muito feias
Mas muitas outras belas e girinhas,
Tão lindas como rosas ou sereias,
Peixões bem superiores às francesinhas
Pois Maconge, apesar de pouca idade,
Andou em graça mais que em fealdade.

IV
Queria cantar em versos sonorosos
Os feitos magistrais dos maconginos,
Os feitos de efeitos estrondosos,
Dum povo de valentes paladinos,
Este povo de homens temerosos,
Espertos, sabedores e muito finos
Que lançaram no outro e neste mundo
Os traços dum civismo bem profundo.

V
Mas para resolver esta maçada
De que D.Caio-o Rei- me incumbiu,
Invoco as musas pois está já esgotada
A veia que outrora distinguiu
Camões, Bocage e toda a mais "cambada"
De poetas que na terra já se viu,
Se por elas conseguir ser atendido
Satisfarei do Rei o seu pedido.

VI
Dai-nos pois uma fúria inimitável
E não a dum piano escangalhado,
Mas sim a dum trombone formidável
Como aquele do Parreira, surdo ousado,
A vossa acção será então louvável
E Maconge p'los outros aclamado.
Que se lance e se cante na cidade
Actos de tão grande temeridade.

VII
Vós sois,ilustre Rei, o descendente
Da família dos Césares chamada;
Não da Roma que havia antigamente
Mas sim da dos Silveiras cá formada.
Tendes palácios onde mesmo em frente,
Com vossa permissão nunca negada
Em pelota se banha o vil gentio
Nas águas do Mapunda, enorme rio.

VIII
Como sois um estudante exemplar
Da cabulice amigo dedicado,
Os mestres resolveram premiar
O aluno mais antigo e calejado,
É só esta a razão a lamentar
Porque já foste muita vez "chumbado",
Mas não vos importeis, de não ser urso,
Pois cadeira a cadeira, faz-se um curso!

IX
E a vós, maconginos, companheiros
Das célebres paródias da noite alta,
Vós que nas aulas éreis os "primeiros"
Vós que toda a semana dáveis falta,
A vós que éreis espertos e matreiros,
Melhores dentre os melhores de toda a malta
Vos dedicamos est'obra para lerem
P'ra não mais de Maconge se esquecererem.

X
Já pela rua vão os estudantes
Em grupos conversando mui contentes,
E uns nas boas notas confiantes
Não sentem da raposa já os dentes,
Outros há que dos grupos vão distantes
Por causa das más notas dos seus "lentes",
Triste fim o deste ano de canseiras
Que nós passámos todo em brincadeiras!

XI
As "feras" no liceu vão reunir,
Na mão a muito suja caderneta
Todos vão preparados para abrir,
E p'ra mandar a malta p'ro maneta.
Alguns começam já por se sorrir
E trocam impressões. Mas a sineta
Ordena que comece a reunião,
E p'ra mesa calados todos vão.

XII
Lá estava o reitor alto e corcorvado
Ao peso da "bicanca" mui comprida;
E também o Mendonça já sentado
A pança tendo ao alto muito erguida.
O Miranda de pé estava apoiado
Naquelas suas pernas de torcida.
Enfim, lá estavam todos os algozes
Que nos fazm sofrer dores tão atrozes.

XIII
Mas já dum canto eleva a voz pausada
Aqueles de todos mais esclarecido.
E co'uma calma já bastante usada
Diz o pedante muito convencido:
"Benevolência, não demasiada
Pois o estudante fica aborrecido"
Este conselho assim tão indecente
Faz com que chumbe quase toda a gente.

XIV
E depois de tão bem aconselhados
Começam nossos mestres a ditar
As notas que nos deixam mui zangados
Quando na pauta as vamos encontrar.
Rompem a série os novos esfaimados
Do Mirandinha que nos quere chumbar,
Mas tendo em dois períodos boas notas
Bem longe estamos de ir consertar botas.

XV
Agora o Paiva Júnior que é bondoso
Começa a ditar notas mui honrosas
Mas vem logo o Mendonça pavoroso
E...oh! desdita! Cita-as vergonhosas.
Ao pensar nisto fico bem choroso
Por ver que nem com cábulas manhosas
Conseguimos pôr fim ao nosso estudo,
E junto à pauta eu fico quedo e mudo.

XVI
Da matança porém o fim chegou,
Na pauta escreve agora o bom Vieira
As notas que a mestrança já ditou.
A Juliana tem por companheira
Na obra que o reitor lhe fixou.
As notas lá as põe numa fileira
Em frente a cada nome e sem engano,
Não pode haver trabalho mais insano!

XVII
Agora é o bom Tavares que vem surgindo
A mui funesta pasta sobraçando,
E na parede a põe com gesto lindo!
E junto à dita e para ela olhando,
Alguns dos estudantes vão sorrindo,
Porém vão-se outros já bem lamentando,
Uma vez mais os hão assim gatado
E o pranto que os desfaz, todo é baldado.

XVIII
Alguns crónicos já no reprovar
Por se verem passados se admiram.
Todos, os parabéns lhes vêm dar
Espantados e felizes do que viram,
Satisfeitos começam a cantar
Mas na secretaria as "feras" miram,
Pois se p'ro ano se não agarrarem
É mais certo chumbados eles ficarem.

XIX
Dos crónicos alguns vou nomear
P'ra que o leitor os possa conhecer.
Por alcunhas e nomes vou tratar
Os cábulas famosos, a saber:
O Rita que o Liceu há-de chorar,
O César com a "checa" de temer
O Mesquita também que todo ufano
O nobre nome tem de Marques Mano.

XX
"Jambone e o seu Bucéfalo" afamado,
O Trino do Armada bom amigo,
O Homero, o eterno reprovado,
Como o Jaime dos livros inimigo.
Marques Pires, o Pedante perfumado,
Tal qual o Lucas e o Petrónio antigo.
É preferível contudo aqui ficar
Para eu em mim próprio não falar.

XXI
Vamos agora à malta estudiosa.
Ao tentar as alcunhas mencionar
(Daquela estudantada mui briosa)
Ante meus olhos passam a saltar
As notas que a tornaram tão famosa.
Exemplo bem difícil de imitar,
Mas Mendonça terrível, Lucas forte,
De todos é o chumbo a triste sorte.

XXII
No cimo desta lista tão honrosa
O de Alves Fernandes aparece.
A seguir, o da Zélia orgulhosa
Das notas que apanha o que merece.
Depois o de pessoa estudiosa,
João da Esquina, nome que não esquece.
Osvaldo, aluno muito esclarecido
E dono dum "penante" conhecido.

XXIII
Barão da Baviera, o perseguido,
Depois o jovem duque de Belmonte,
Segue-se o Rei, nos versos conhecido
Pois bebeu já da Beócica Fonte.
De outro o nome vem, que foi vencido,
P'lo Mendonça, que dá chumbos a monte.
E em seguida os menos importantes
Da dita lista de bons estudantes.

XXIV
Como os alunos são já conhecidos
Os seus feitos passemos a narrar.
Falemos dos hérois desconhecidos
Daqueles que não farto de cantar.
Se estes terminar e forem lidos
Verão que feitos são de admirar.
E cantarei p'ra que saiam da lama,
Espalhando pelo mundo muita fama.

XXV
A fala dum aluno mau estudante
Antes porém eu quero descrever;
Eis que indo em boas notas confiante
Sem medo a pauta fúnebre foi ver.
Em Inglês gatado. Era o Brilhante.
Pois claro, outro não podia ser.
Então a maldição tirou do peito,
Maldição que caiu no tal sujeito.

XXVI
Oh! glória de chumbar,oh! triste sorte,
Assim atiças tu do ódio a chama.
Tu, Bicancas tirano de má morte
Que só em gatar criaste fama,
Levarás no nariz um soco forte
Tão forte que parar irás à cama,
Agravado também terás um calo,
Além de coisas mais em que não falo.

(*)(cf. Primeira Edição, de 1959, Agosto, nas Festas da II Confraternização da Antiga Malta do Liceu. Autorizadas a circular, por Sua Majestade Severíssima, D. Caio Júlio Cesar da Silveira.)
Marcadores: 1959, CÉSAR PAULO DA SILVA, RUI FERREIRA COELHO

Fonte: Blogue "PoeMaconge"

Macongíadas - Canto Segundo

via PoeMaconge by noreply@blogger.com (José Jorge Frade) on 7/14/08
I
Foram ditas as frases que escutaram
Mas que ainda não deram resultado.
Por enquanto o nariz não amolgaram
Nem o calo também está agravado;
Porém os fados rudes fixaram
Que esse aluno ficasse reprovado.
E desde então ele nunca mais passou
Só porque aquela maldição lançou.

II
A vida do estudante é de amargura,
Ao Liceu preso uma manhã inteira.
Mas muitas vezes tem também doçura
Isso dirá a malta companheira.
E quanta vez o povo nos atura
Na serenata, de noite, em barulheira.
E no fim vem depois distribuição
Do néctar de um grande garrafão.

III
Mas como tudo tem começo e fim,
Pelo princípio vamos começar.
Não é pelo leitor, mas sim por mim
Que eu quero tudo muito bem contar.
A nossa "prima" festa foi assim:
Resolveu Sua Alteza decretar
Que se cantasse em noite luarenta
Tendo a batina como vestimenta.

IV
Todos demos dinheiro para a boda
A fim de comprar coisas de engolir.
Nove horas. No jardim a malta toda
Aguarda só a ordem de partir.
Rompe a marcha c'uma cantiga em moda.
Cantamos alto para tudo ouvir.
E na rua se fez tal chinfrineira
Que acordámos a cidade inteira.

V
Mas inda poucos passos eram dados
Quando um gorgolejar todos escutámos.
Ficámos um momento mui espantados.
Fizemos alto. Logo investigámos.
E num dos garrafões desarrolhados,
Um dos colegas a beber topámos.
E por estar escuro eu não sei quem seria;
Mas mesmo que o soubesse não diria.

VI
Passado estava já o incidente
E novamente a música tocava,
Mas o nosso colega descontente,
Olhava o garrafão e o chorava.
A música findou. Alegremente
A filla de tunantes caminhava.
Era tocada a marcha de Maconge.
Com voz tão forte que se ouvia ao longe.

VII
Do Colégio pr'as Maias nós passámos;
A janela vieram descerrar.
As músicas que nós lhes dedicámos
Tiveram o condão de as encantar.
Pr'a Rotunda partimos. Lá parámos.
E a fim da garganta refrescar,
Distribuiu-se vinho à malta toda.
Assim começou, pois, a nossa boda.

VIII
Comeu-se pão, chouriço e muitos bolos,
A mistura com coisas bem picantes,
Para empurrar bebendo quatro golos,
Cinco litros se foram nuns instantes.
Gorgolejando alguns faziam solos,
Com estalos e estalinhos bem cantantes.
Enfim! Foi tão intensa a animação
Que muitos se rolaram pelo chão.

IX
Veio por fim a ordem pr'a partir,
Rompeu a marcha. Todos mui direitos,
Um a um começámos a seguir.
Nós ao álcool não estamos muito afeitos,
Mas soubemos o vinho repartir,
E parámos no Gaio. Com trejeitos,
Entoa Emílio bela cantilena,
De alegre balar e letra amena.

X
O vinho, entretanto, fez efeito,
E por cambalear alguns começam,
Dizendo coisas vãs, sem nenhum jeito.
P'ra mencionar os nomes não me peçam
Porque seria um acto bem mal feito.
O que me interessa a mim que a rua meçam
Debaixo de grossura tão tremenda
Se de nada lhes vale a reprimenda?

XI
P'ras Mascarenhas vamos em seguida.
Cantando alegre marcha, sem engano.
O Mário Andrade, ao alto, leva erguida
A chapa que nos diz do sexto ano.
Osvaldo leva a vela corroída,
E a música alumia todo ufano.
Vai também o Cabinda, convidado,
Que toca bem guitarra e canta o fado.

XII
Da Lourdes p'ra Irene mui formosa
E para as Alexandres em seguida,
Ia seguindo a tuna já famosa,
Cantando uma canção enternecida
E logo a seguir marcha ruidosa,
A malta já na escuridão perdida,
Tentava andar um pouco mais ligeira,
Mas a isso se opunha a bebedeira.

XIII
Prodígios de equilíbrio vai fazendo,
Tentando as vozes pôr na mesma altura!
Mas apesar das pernas ter tremendo,
Continua a manter a compostura.
Gilberto ao violino é estupendo!
Acaba de tocar a partitura!
E nos banzou ali de tal maneira,
Que quase nos passou a borracheira.

XIV
Depois de vários sonos perturbar,
De ouvir do Rita frases de ternura,
Outras gentes nós fomos acordar,
Cantando em voz pastosa de grossura,
Mas quando no jardim ia a passar
A tuna, oh, que tristeza! Que figura!
Encontramos 'stendido o Armandinho.
Talvez por ter bebido pouco vinho.

XV
Todos falam, murmuram, sem olhar,
Para o estado tristíssimo em que estão.
E de novo voltamos a marchar
P'ra janela da prima do Falcão,
Depois de o seu sono despertar,
Tocámos à Cordália uma canção.
Cantou Rosári um fado (e muito bem)
Daqueles da sua terra: Santarém.

XVI
Não vou narrar agora o sucedido,
Depois de a esta porta ter cantado,
Porque isso seria aborrecido,
E ficaria tão envergonhado,
Como fiquei ali entristecido,
Ao reparar no lastimoso estado
Em que ficara a nossa bela tuna.
Desculpe-me o leitor esta lacuna.

XVII
Já não tenho decerto inspiração
P'ra contar como o ano terminou.
Direi somente que bem poucos são
Os que a sanha dos mestres aprovou.
Mas desses não saiu a maldição
P'ra raposa que todos mordiscou,
Porque apesar de tristes bem ficarem,
Lauta ceia se fez p'ra se alegrarem.

XVIII
Depois duma soneca mal dormida
Por insónias cortada sem cessar,
A malta acorda triste e aborrecida
Por a labuta ter de retomar.
É dura e mui espinhosa essa vida
Daqueles quie os lentes têm de aturar.
São lições, mil trabalhos, arrelias,
p'ras gatas evitar todos os dias.

XIX
Já no Liceu a "Tavarina" hora
Na sineta soou lugubremente
Entre a malta que há puco inda cá fora
Por uma borla esperava avidamente.
De todos a expressão é de quem chora,
Pois ela se desfez rapidamente.
Nada mais há a fazer do que ir p'ra aula
Que é de todos nem mais que a cruel jaula.

XX
Na secretária o fero professor
Co'nome de Mendonça está sentado.
É p'ra nós o gigante Adamastor
Que ao Gama apareceu no mar irado.
Chama um aluno tremente de pavor,
Pois ali num instante é "degolado",
Triste sorte a daquele que num minuto,
Por asnear é nomeado bruto.

XXI
Como outrora um nauta no seu lenho
Está hoje cada aluno na carteira.
Tremia aquele co'tempo fero e sanho,
Este geme ao largar alguma asneira.
Mas a ambos não serve aquele engenho
Quando é chegada a hora derradeira.
Para o primeiro as vagas alterosas;
Para o segundo as lições bem custosas.

XXII
Vou descrever em traços mal pintados
O mestre que nos faz estremecer:
De hercúleos membros, tão avantajados,
A força herdou de Rhodes ao nascer,
A face de sobrenhos carregados
O cinto na barriga a querer descer,
Nas aulas de Ciências se comporta,
Como raio que tudo fere e corta.

XXIII
Vem depois o latim aborrecido
Que se traduz somente a adivinhar.
O predicado em baixo está escondido,
Para o sujeito tem de se saltar.
Há ainda o pronome indefinido
E o advérbio para declinar.
Com tamanha mistura e barafunda,
Melhor é aprender a língua ambunda.

XXIV
A História que começa antes do mundo,
É terrível e enorme calhamaço,
Que o Paiva Júnior com saber profundo,
Vai ensinando sempre a passo e passo.
Com o programa tão grande e tão jucundo,
Não sei como a cabeça não desfaço.
Com trajanos e Neros rancorosos,
Nós somos hoje alunos desditosos.

XXV
A seguir é a Moral aborrecida
E a Literatura mui bisbilhoteira
Pois quer saber dos escritores a vida
Desde a nascença à hora derradeira.
Às vezes uma peta é bem metida,
E outras mais provocam galhofeira.
Nós desculpamos, pois, se assim não fosse,
O estudo era só rijo e nada doce.

XXVI
A Geografia então é bem terrível
Com nomes às centenas e aos milhões.
O estudo da Botânica é incrível,
Com tantos nabos, couves e feijões.
Depois a Zoologia onde é possível
Chamar aos chipanzés nossos "irmões"
E temos que aturar bem pacientes
Este calvário atroz de penitentes.

XXVII
A Álgebra dá-nos muito que fazer,
Com senos e co-senos bem puxados.
Temos também ainda que aprender
Os métodos e leis bem engendrados.
O Walter dos alunos quer fazer
Filósofos à arte dedicados.
Mas como o Neves diz (e eu considero)
Que apesar disto apenas somos zero.

XXVIII
E andamos nós uma vida inteirinha,
A fio sete anos a estudar,
Para no fim a mísera notinha
Dum aspirante estarmos a ganhar.
Ficamos magros como a magra espinha
Pois levamos a vida a aspirar.
Inda por cima os mestres carniceiros
Só querem que sejamos carroceiros.

XXIX
Mas deixemos por hoje as desventuras,
Que as desventuras fazem-nos chorar.
Lancemos para trás as amarguras,
Pensemos na alegria e no gozar,
Lembremos as pielas muito duras
Que todos apanharam a cear,
Esta ceia com lábia corriqueira,
Vou relembrar a malta companheira.

(*)(cf. Primeira Edição, de 1959, Agosto, nas Festas da II Confraternização da Antiga Malta do Liceu. Autorizadas a circular, por Sua Majestade Severíssima, D. Caio Júlio Cesar da Silveira.)

Macongíadas - Canto Terceiro

via PoeMaconge by noreply@blogger.com (José Jorge Frade) on 7/14/08
I
Aproveitando a bela camaradagem
Que os colegas do Huambo nos fizeram,
Resolveu-se fazer uma homenagem
Àqueles que junto a nós aqui vieram.
Enviou então D.Caio uma mensagem
Aos nobres maconginos, os quais deram
Dinheiro p'ra uma ceia verdadeira,
Em honra feita a uma Nação estrangeira.

II
Foram o Vieira e a sua esposa Andreza
Que fizeram os festins tão delicados,
Pois notada por todos é a destreza
Desse belo casal, em cozinhados.
Foi servido o jantar em grande mesa
Que mil delícias deu aos convidados,
Antes porém eu quero apresentar
Alguns daqueles que estavam a cear.

III
O Sócrates por todos conhecido,
Tem um nome por si já afamado.
Aluno muito esperto e entendido
P'los outros sendo querido e respeitado.
O Lara que História sabe de ouvido
Tão bem que conseguiu ficar gatado.
O Neves conhecido por João,
Poeta de elevada inspiração.

IV
Temos ainda o Rei do bandolim
(João d'Almeida, filho de seu pai).
Depois o grande mestre de latim,
Carvalho, que entre todos sobressai.
E a seguir a estes vem enfim
O Rita que com tudo se distrai.
Há também o carquejo perspicaz
Que com a pinga em riso se desfaz.

V
Vê-se uma tola em forma de melão,
O que indica que o Hugo está presente.
E d'entre toda aquela multidão
D.Caio sobressai já sorridente.
Ao lado deste o nobre cidadão
Barão da Baviera está contente,
Talvez por reparar quão bem regado
Viria a ser jantar tão afamado.

VI
Havia muitos nomes pr'a dizer
Mas não vale a pena mencionar.
Melhor, muito melhor é descrever
O que D.Caio disse ao discursar,
Com formas que fez todos comover,
Deixando a multidão a palpitar.
Com gesto encantador e bem lançado
Começou o discurso há tanto esperado:

VII
Vós, irmãos, de outra terra bem distante,
Por todos nós imensamente queridos,
Levai, na vossa alma radiante,
Os sólidos afectos já vividos,
De todos os que aqui estão neste instante.
De palmas, grande salva, os ouvidos
Com fúria atordoou, da malta ousada,
Que depois se lançou à caldeirada.

VIII
Por toda aquela mesa bem espalhados
Se viam muitos pães e muitos pratos,
E também muitos vinhos perfumados
Que às vezes às cabeças dão maus tratos,
Armando entre os que estão mal precatados
Terríveis e cruéis espalhafatos.
Pelo ar se evolou cheiro esquisito
De boa caldeirada de cabrito.

IX
O Rita, pelo vinho comovido,
Tendo na voz tremuras soluçantes,
Quis discursar. Mas antes, um pedido
Ele desejou fazer aos circunstantes:
Queria benevolência. E atendido,
Começou com palavras bem cantantes:
Nem de Camilo ou Braga eu tenho a "verbe"
Pois sou ainda moço imberbe.

X
A vida é uma espinheira mui cerrada
Por onde têm todos de passar...
A malta tem de ser bem avisada
Para que nela se não vá picar.
Aqueles de quem a sorte está lançada
E que outro novo rumo vão trilhar,
Ouçam bem as palavras dum profeta
Se querem atingir depressa a meta.

XI
Naquela altura os vinhos espumosos
P'la cabeça começaram a subir.
E todos se sentiram venturosos
Comendo e conversando sempre a rir,
Nem pensando nos chumbos vergonhosos
Que estavam mesmo prestes a sair.
Os líquidos nos jarros não pararam
E muitos logo ali se embebedaram.

XII
Contou depois o Corte enorme história,
Desde os tempos remotos do Liceu,
Evocando o passado e sua glória
E tudo ali tão bem ele descreveu
Que ficou bem gravado na memória
De forma que a ninguém mais esqueceu.
Contou seguidamente uma chalaça
Que com cócegas só, metia graça.

XIII
O Vitória depois foi convidado
A tomar a palavra num momento;
Ficou, mau grado seu, atrapalhado,
Fazendo uma figura de jumento.
Gaguejou e sentindo-se embuxado
De novo a retomar ia o assento;
Mas o Rita, rapaz de perspicácia
Pediu-lhe então p'ra falar de farmácia.

XIV
Calado estava o Sócrates sentado
Em frente a dois copitos, radiante,
Quando pelos presentes foi saudado,
Compelido a falar naquele instante,
Levantou-se com calma e, contristado,
Mostrando um certo ar cambaleante,
Apenas disse: Isto é o fim do mundo,
Deixem-me em paz pois já não sinto o fundo.

XV
Depois de terem todos bem ceado
Alguns nem dar podiam cinco passos,
E outros condoídos de tal estado
Para casa os levaram em mil braços.
E agora que isto tudo foi contado
Com milhões e milhões de erros crassos,
Só desejo alegria à multidão
Bem como ausência de reprovação.

XVI
Como as musas começam a falhar
E a sombra de Camões a estremecer,
O poema é preciso terminar,
Que todo o macongino o venha a ler
Como D.Caio, o rei, vai ordenar
Com toda a sua força e seu saber.
Que a voz deste poema vá bem longe
Espalhando a eterna glória de Maconge!

(*)(cf. Primeira Edição, de 1959, Agosto, nas Festas da II Confraternização da Antiga Malta do Liceu. Autorizadas a circular, por Sua Majestade Severíssima, D. Caio Júlio Cesar da Silveira.)

MACONGÍADAS – Canto Quarto

Que Maravilha! Parabéns José Jorge Frade pela publicação deste bonito poema.
Rui Moio

via PoeMaconge by noreply@blogger.com (José Jorge Frade) on 7/15/08

I

Desde então muitos anos já rolaram
Sobre nós mil desgraças se abateram!
Nenhum dos maconginos as narraram,
Nem tão pouco nenhuns as descreveram;
Ninguém com tinta e génio as relataram
- Dores e lágrimas que sempre bem esconderam – !
Por isso, uma vez mais aqui estou eu
P'ra contar como tudo aconteceu!

II

Sobre o reino caíra a letargia
Bem como já um certo esquecimento
Que se ia acentuando dia a dia,
Imbuído de saudade e sofrimento!
Faltavam novo fôlego e energia!
Havia que trazer-lhe algum alento!
Em hora benfazeja ele apareceu
E logo, logo tudo renasceu!

III

O Carlos que é também Victória Pereira,
Por achar ser mais chique e de bom tom,
Mudou o nome da família inteira
P'ra ser antes, porém, Mac-Mahon!
Após alguns anitos de canseira
Resolvera voltar a porto bom,
Trazendo em vez da capa e da batina
Um canudo – doutor em Medicina!

IV

E numa jantarada de homenagem,
Co'o Saraiva, Fontoura e o Rogério
O Carlos preparou esta mensagem
(Logo, ali, acatada bem a sério,
Achando boa ideia tal critério):
Que os festins seriam repetidos
E, de vez para vez, mais concorridos!

V

A par de tudo, havia que lutar,
Num desejo par'cendo veleidade,
- E muitos se deixaram arrastar,
Varrendo lés a lés toda a cidade,
Como vento veloz, sempre a soprar,
Num crescendo de força e ansiedade –
P'lo que era desejado e lhe faltava:
O Ensino Superior que a Huíla esperava!

VI

O Rei fora forçado a abalar;
Sua função, até, diminuída,
Mas logo que os arautos foi escutar
Tratou de se empenhar e, de seguida,
Ceptro real tornou a empunhar!
A conselhos sagazes deu guarida
E com a "malta fixe" a aprovar,
Em 70 o Saraiva nomeou,
Vice-Rei que tão bem desempenhou!

VII

Este, então, de mãos livres, já liberto,
Tratou de dilatar o reino seu!
Como era muito fino e muito esperto
Com mestria e saber o engrandeceu!
Criou à sua volta e deu bem certo,
Com um ardor que nunca feneceu,
Sobas fiéis a quem deu mil sobados,
Novos Duques, Barões são nomeados

VIII

Que, pouco a pouco, ergueram a nação!
A côrte até às damas foi aberta
Dando ao reino, afinal, maior expressão!
Quando a trica, que vem de parte incerta,
Começa a semear a confusão,
O melhor a fazer é estar alerta!
Em Luanda qu'ria o Rei a capital,
Decisão que, por certo, caiu mal!

IX

Devido à efervescência assim criada,
D. Caio, o Vice-Rei quis demitir!
Tal atitude, por todos criticada
E que ninguém havia de aplaudir,
Tornou a Academia turba irada
Tal bomba preparada p'ra explodir!
Se do Rei o intento fosse além,
O reino ficaria sem ninguém!

X

Porém, tudo acalmou quando o bom senso
Se sobrepôs àquela confusão!
D. César retratou-se e se bem penso,
O Vice-Rei, agia com razão!
Depois deste período triste e tenso
De mágoas se limpou o coração!
Fez-se, depois, festejo bem bonito
Preparado p'lo Farrica, no Lobito!

XI

Como era de prever, já de antemão,
Os velhos Professor's foram partindo,
Depois, de geração em geração,
Novos valores se foram exibindo,
Como Mestres que deram sua mão,
Ao bom caminho a muitos conduzindo!
Maconge, assim, expandia sua glória,
Mais umas linhas de ouro em sua História!

XII

Quer minuto a minuto, dia a dia,
Tant'outras aventuras se viviam,
Soprando um frenesim na Academia
Que todos experimentavam e sentiam
Num culto de Amizade e de Alegria
- A regra porque todos se regiam –!
De lés a lés bramiam fortes ventos
Tornando os maconginos uns portentos!

XIII

A grandeza do Reino era exigente,
E forçava a criar a sua lei!
E foi assim que, quasi de repente,
O nosso amado Caio – grande Rei –,
Impulsivo quiçá, também prudente,
Movido por si próprio e pela Grei
Ordenou a feitura, co'atenção,
Da base de uma sã Constituição, (*)

XIV

Mas houve novo embate, desta feita,
Estando o Vice-Rei com toda a malta,
Pois a César tomara por desfeita
Que seu filho varão – tremenda falta –
Fosse afastado, longe da ribalta,
Se a morte, disfarçada de maleita,
Viesse p'ra cumprir o seu destino!
Mas seu filho nem era macongino!

XV

Depois de discussão e palratório
Achou-se que a D. Mário e a D. Silveira (**)
Só era permitido – obrigatório –
Concorrerem os dois, de igual maneira!
Acabou-se, por fim, o falatório,
Acabou-se, por fim, a chinfrineira!
Corrigiu-se, por isso, o que era mal,
Com decisão deveras curial!

XVI

Também nestes debates se assentou
Que além destes, tant'outros, se quisessem
O trono, que a celeuma levantou,
Podiam ocupar, desde que dessem
As provas que o passado alicerçou,
P'ra que, ali, as disputas logo cessem!
E, de novo, voltou a calmaria
Por todos recebida co'alegria!

XVII

Mas nem tudo era farra ou só Entrudo!
Havia muito mais do que aparência!
Forçoso era criar bolsas de estudo
Para os pobres de viva inteligência!
Ajudar sim, ajudar mesmo em tudo,
Suprindo, se possível, a carência!
Um lema a que Maconge não fugiu,
Um lema que, aliás, sempre cumpriu!

XVIII

Varrida por lufadas de bom ar,
Já se divisa enorme sementeira
Que o reino teimará em alargar,
Cobrindo, pouco a pouco, a terra inteira!
Outros, por exemplo, o Arrimar,
Mudaram-se p'ra China, tão estrangeira
E arrostando até com o que era mau,
São bem Maconge em solo de Macau!

XIX

O futuro, porém, fero e cruel,
Preparava p'ra nós, – oh quem diria –,
Disfarçado de sonhos e de mel,
Arrotando à mais vã democracia,
A partida tão vil que conteria
O travo bem amargo que há no fel,
Roubando (que tragédia que isto encerra!)
Angola Portuguesa – a Nossa Terra! –

XX

Depois o caos, a guerra, o desvario
Caíram sobre o povo macongino!
P'ra muitos, um caixão soturno e frio;
Mas outros, bafejados p'lo destino,
Apesar do tremendo desatino,
Puderam afastar o negro trio,
Talvez por ser diferente a sua sorte:
A Fome, a Peste, sem faltar a Morte!

XXI

A trágica diáspora nasceu,
Embora em todo o mundo, mais aqui!
Mas Maconge, porém, não esmoreceu,
Por tudo o que já sei e p'lo que vi!
Mais desgraça nos ombros se abateu
Dando tristeza que também senti:
Morreu o Rei, de dor e de revolta!
Mas paira a sua sombra à nossa volta!

XXII

A dor, a pouco e pouco mais esbatida
Parecia como um sonho de mau sono;
Era preciso prosseguir na vida
E encontrar quem ocupasse o trono!
E nas Côrtes de Coimbra é decidida
Escolha dum rei activo e não um mono!
Como uma só voz se levantasse
Pediram ao Saraiva que aceitasse
Todos queriam, num coro bem perfeito,
Que Saraiva, monarca fosse eleito!

XXIII

Este, porém, num gesto de humildade,
Não aceitou tamanha distinção!
Provou ser bem modesto e sem vaidade
Quando tomou tão sábia decisão:
Vice-Rei só, enquanto a sanidade
Da sua alma e corpo tem na mão!
P'ra governar o mundo macongino
Era capaz, sagaz, de muito tino!

XXIV

D. Roberto, talvez como excepção,
O trono de seu pai não quis tomar,
Declinando – que boa solução
Por tudo resolver, facilitar –
No outro candidato, a votação
Que a seguir se viria a efectuar!
Por isso, D, Saraiva volta à liça,
Figura alta, esguia e inteiriça!

XXV

Haveria um só Rei e mais nenhum!
Vice-Reis sim, assim ficou assente!
D. Caio era sempre o número um,
A figura de proa, o eminente!

Não existe acto algum, mas mesmo algum,
Que, em retrato, não esteja ali presente,
Parecendo que escutamos sua alma,
A todos transmitindo a sua calma!


(*) Nas Côrtes Gerais, de 1971, fez-se a aprovação da Lei Fundamental do Reino.
(**) D. Roberto Silveira já julgado e considerado Macongino Honoris Causa é, nas mesmas Côrtes, elevado à categoria de Príncipe Real.
Obs.: O Rei faleceu em 1977 e as Côrtes reuniram-se, em Coimbra, em 1978.

MACONGÍADAS - CANTO V

I
Falo, agora, de Lady Anabela,
Lady Aiva, primeira do harém,
Que tem o Vice-Rei sob tutela,
Que ao pé do Vice-Rei parece bem!
Casal que, pelo reino, sempre vela,
Apesar do seu paço em Santarém!
Que a Parca os olvide muitos anos,
Que não nos traga, já, mais desenganos!

II
O Nosso Vice-Rei tem D. Olavo
P’ra seu braço direito e com razão!
Faz deste um seu amigo, não um escravo
E seu representante sempre à mão;
Mesmo nas horas de maior agravo
O Godinho lhe dá satisfação!
Agora, falarei seguidamente
De outros, por motivo bem diferente!

III
O Zito é o cantor e violeiro,
Já que não se fabrica o alaúde!
D. Patalim – o Bispo a “copo” inteiro, –
Quando a beber nos reza p’la saúde!
O Pipo, especialista em cancioneiro,
Que não renova e trata como grude;
O Rui que há de meter sempre o bedelho
Convencido que é gente, não Coelho!

IV
Da velha-guarda há vários vivos inda:
A Zélia mais o Mário, eternos azes,
Não desprezando a fama sempre infinda
De serem os melhores entre os capazes;
O Corte e o Oswaldo na berlinda,
A Alda, que era alta entre os rapazes,
O César Paulo que calcou a lira,
O Jorge e o Ferronha, malta gira;

V
O Bentudo, careca e narigudo,
Mário Andrade e o Boi-Ápis preguiçoso;
O Zé Ninguém que negoceia em tudo
Desde que ache o negócio proveitoso;
O Rui Seca, a sorrir, nada sisudo,
Contador de aventuras que dão gozo,
O Cláudio, o Verânio mais o Pratt!
A memória já falta e mais não dá!

VI
Garotas adoráveis do meu tempo
Sois hoje, mães, avós, mas sogras não,
Que a bondade do vosso temperamento
Não permite tão negra aberração!
Sei qu’inda soltais mais do que um lamento
- Que faz doer bem fundo o coração –
A recordar o beijo que se deu
Com o vosso namorado do Liceu!

VII
Outras gerações se sucederam
Que deram a Maconge brilho eterno,
Páginas saudosas se escreveram,
Sempre prenhes de espírito fraterno!
Sabem todos quem são e conheceram
Já do tempo de antanho ao hodierno:
O Pilhas, o Amaral, o Marques Pinto,
O Inês, aveirense – sou sucinto! -,

VIII
Não podemos esquecer o Ananaz
Que com a sua Mali, lá em Leiria,
Mostra à saciedade, que é capaz
De organizar, da noite para o dia,
Uma farra que a todos satisfaz,
Cheia de cor, de graça e alegria!
Mas outros há, de idêntico valor,
Pois Maconge de génios conta um ror!

IX
Torres Vedras – o Sérgio, diligente,
Não dorme, sempre pronto a trabalhar!
E dentre tanta, tanta, tanta gente,
Outro nome é forçoso recordar!
Seria uma injustiça, era indecente
Que aqui me esquecesse de indicar:
O Vinhas, residente no Seixal;
Nas festas que organiza é bestial!

X
São alguns dos exemplos a apontar!
Peço perdão pois inda há muitos mais
Que gostaria aqui de mencionar,
- Não cabiam seus nomes nos Anais –
Razão porque tive de encurtar
O rol de outros tantos, tão leais!
Não podia deixar – ficava mal –
De falar de Maconge em Portugal!

XI
A chama continua sempre acesa,
O facho continua a rebrilhar!
A malta está unida e bem coesa,
“Per sécula” se assim continuar!
Com vontade, com fé, sem tibieza
Para sempre os seus laços reforçar!
São prova, duma forma bem cabal,
Leiria, a Parede e o Seixal!

XII
Apraz-me registar, com muito apreço,
Nas nossas reuniões, nossos repastos,
A presença de Mestres que conheço,
Alguns de anos cansados e já gastos,
- Que são da vida o seu eterno preço –;
A Cerveira, Simões e outros, fastos,
A Céu e o Higino sempre afoito
Sem esquecer o Coutinho – o Binte e Oito – !

XIII
Não só à comezaina se limita
Nossa Camaradagem e Amizade!
A sêde de entre-ajuda é infinita,
Como infinita é nossa saudade!
O macongino sabe e acredita:
- Não é pura ilusão mas, sim, verdade –
Se precisar, todos lhe dão a mão!
E conta em cada peito um coração!

XIV
Também somos felizes co’a certeza
Que a saga de Maconge se propaga!
Exuste sempre a taça em nossa mesa
Onde bebe o estudante. A sua paga
Limita-se à promessa, com firmeza,
De outros trazer, numa crescente vaga,
Transmitindo, aos vindouros, o destino
Do que há de bom no berço macongino!

XV
Há um marco a referir neste reinado,
Que se deve exaltar, enaltecer:
Viagem a Macau, tão afastado,
Que fomos abraçar e conhecer!
O Vice-Rei mostrou o seu arado,
P’la forma como sabem receber:
Com carinho, com pompa e circunstância,
De nostalgia eivados p’la distância!

XVI
Prestou-nos homenagem o Senado
- Leal Senado um nome conhecido –!
Tal gesto de lhaneza há calado
No nosso coração agradecido!
Visitas, culminando, dia entrado,
Com um lauto jantar e bem servido!
Sem querer ninguém ferir com desprimor,
P’ra o Victor, sua Esposa, o nosso Amor!

XVII
Há tanto que dizer, mas para quê
Se o silêncio também tem sua voz?
P’r’além do que se escreve e que se lê
Vale mais o que escondemos dentro em nós,
Ou algo em que se pensa, em que se crê!
Recordai vossos Pais, vossos Avós,
A vossa infância, a Terra lá ao longe!
Fazê-lo é reviver sempre MACONGE!

Adenda às Macongíadas

via PoeMaconge by noreply@blogger.com (José Jorge Frade) on 7/14/08
(Poema na Ceia de Maconge,
Em Alte, no Algarve, a 29/30 de Janeiro de 2005.)

CANTO Km 16
Aquele Canto a Caminho da Huíla e da Chibia

XVI
Havíamos de escrever tão pasmados
Contos de nossas casas e cabanas,
Porque um dia fomos escorraçados
Daquelas nossas roças e choupanas,
Em perigos e guerras entalados
Muito para lá da razão humana,
E entre os amigos edificaram,
O Reino de Maconge que fundaram;

XVII
Como a Fénix renasce o Liceu.
Após anos e anos infindáveis,
Recebo um convite com nome meu
Que me faz recordar que lá andáveis
Dias lindos em que brilhava o Céu
Qual escola de sonhos intermináveis
Porque neste papiro aconteceu
Encontrar amigos tão memoráveis.

XVIII
É hoje o Velho Higino que escolho
Para nos dar aulas de Português
Camões não era cego, mas zarolho
Tantos e geniais poemas fez
E via muito mais por um só olho
Que todos os demais vêem por três
E de tantas iguarias com molho
Bota gindungo nelas que já vez.

XIX
Depois, à beira do rio Mapunda,
Em Alte, Algarve, a 30 de Janeiro,
O Rocha com a guitarra à cacunda
Qual mistura pura de sanzaleiro
Dom Giraldinho, que é quem fecunda
Todas as bênçãos dos vinhos matreiros
Libertos dos valores de quem funda
Esses reinos outrora tão porreiros

XX (DEZAVINTE)
E cantámos o Hino do Liceu
E lá em Cima Está o Tiro Liro
E a Morte Que Matou Lira nos deu
Um sentimento antigo de Retiro
Nenhuma lágrima então correu
Nem sequer se ouviu um único tiro
E lembrei-me dum grande amigo meu
Da Escola Industrial e Tchivinguiro.

XXI
Recordámos ainda e com mistério
Porque também eram da Academia
As lindas alunas do Magistério
Pelas quais muito bravo então gemia
Corações que não eram de minério
Mas da mais pura e bela fantasia
Ainda havemos de falar a sério
Desse belo tempo que então corria.

XXII
E não pensem que vamos esquecer
Quem desta história também parte fez
Os do Instituto, está bom de ver
E os putos fixes da Escola Marquês
Candengues das escolas a correr
Por esses lugares onde uma vez
Que em Alte fizemos reviver
E onde havemos de voltar, talvez.

sábado, 19 de julho de 2008

Trovas do Exílio - I

via PoeMaconge by noreply@blogger.com (José Jorge Frade) on 7/16/08
Eis o Grão-Soba que na embala primeiro
habita, o Vice-Rei de Maconge em iluminada
sala observa e ao bardo macongino, por inteiro
lhe narra os feitos da invencível armada
que em outros tempos o Cunene viu fragueiro.
Dos mundimbas se ouviu a poderosa batucada
lá na Oncócua feudo da alvoroçada gente
que se estende pela savana até ao Oriente.

Se os velhos pioneiros que andaram
tantas terras para verem os segredos delas
no florido planalto da Huíla se ficaram
por certo nós hoje faremos dos sonhos as velas
que com o vento da tradição se insuflaram.
Rumaremos às novas gerações e as virgens telas
pintaremos em chicoronhas tonalidades
a História feita em angolanas idades.

E deu-me o Vice-Rei do seu trono licença
para narrar em verso bem acabado
o famoso acontecimento que sem detença
faço agora de ricos versos adornado.
Do Dongue, seus vassalos de fortuna imensa
foram feitos sobas no mungambo condado.
O ilustre Muhona feliz bem recebe
enquanto a turba contente come e bebe.

A batucada foi tão forte que usada na guerra
ao inimigo os mungambos fizeram dano;
e assim, não tendo já a quem vencer na terra,
vão em grandes saltos acometendo o oceano
de capim que s'espalhando até à finisterra
faz da chana a pátria eleita do africano.
E já se vê de ceptro sobal, maboque e piteira
o Soba Donguense D. Carlos Marques Vieira.

Trovas do Exílio - II

via PoeMaconge by noreply@blogger.com (José Jorge Frade) on 7/16/08
E na embala do Vice-Rei mais se ouviu
dos feitos dos barões que o Reino dilataram
e até das palacianas intrigas se permitiu
que fossem em verso cantadas e provaram
não ser certo o que antigamente se ouviu
em cochichos que outrora se espalharam:
Nunca o Vice-Rei o Título de Soberano
ousou retirar ao dos Suseranos o Suserano.

E também se contou que a ímpia gente
do Mar das Antilhas, a Senhora do Monte roubavam
deixando a branca capelinha num repente
sem a imagem que os naturais tanto amavam.
Levantou-se então um brado tão potente
do peito dos muílas que ali estavam
que os estrangeiros recuaram sem tardar
colocando a veneranda imagem no seu lugar.

Ainda os filhos do Mucúfi o exílio escuro
não conheciam ou nele pensavam,
na huilana terra de clima ameno e puro
a feroz jornalista Fernandina julgavam
na solene escadaria de mármore duro
onde os nobres do Reino se assentavam.
Depois que D. Adrega, Bispo santo perdoou
a inimiga depôs as armas e chorou.

Que este Reino da fantasia e da lenda
permaneça pelos tempos sem parança
pois em seu espírito é banhada a legenda
que o Duque do Chaungo ora avança
alevantando a sua bandeira estupenda:
acima o Reino de Maconge que a rubra lança
se espete na armadura azul do firmamento
para que a sua glória não caia no esquecimento.

Trovas do Exílio - III

via PoeMaconge by noreply@blogger.com (José Jorge Frade) on 7/18/08
De Coimbra a Musa partiu a exercitar-se
nas Terras Altas da huilana Minerva
e do Mondego fez passar-se
a pisar da Planalto a fértil erva.
Quanto pode do Choupal desejar-se
tudo o soberbo Apolo ali reserva.
Aí as flores são tecidas a ouro
e o capim é sempre verde louro.

Nobres sobados o chicoronho edificou
chitacas, arimbos mui seguros,
e quase o Reino todo transformou
com edifícios grandes e altos muros.
Mas depois que o Feiticeiro da Guerra cortou
o fio de seus dias já maduros,
foi-se a Terra, veio a fuga desordenada
e para a hispânica eira foi de abalada.

Nunca com outras Razias gente tanta
veio o lusitano campo enchendo.
E o Reino de Maconge os Deuses ora espanta
por a todos unir num abraço estupendo,
a huilana gente do bárbaro fugindo levanta
a tocha arrancada ao abraço horrendo
da Morte. Ao longe o fumo espesso da granada
a esventrar toda a terra civilizada.

Agora que as Ninfas do Mondego se calaram
Se alevantem as Caculovádis1 da Morte escura
Pois as lágrimas choradas se transformaram
Por memória eterna, em fonte pura.
O nome lhe puseram, os que por ali passaram
de Senhora do Monte, que inda dura.
Vêde que fresca fonte rega as raízes
dos Maconginos, mortais felizes.

E vale a pena cantar o poderoso Reino-Império
que das terras de Maconge ao Cuanhama
D. César da Silveira sem vitupério
conquistou com garbo e gloriosa fama.
Vós, poderoso Rei, que do assento etéreo
onde subiste, a bênção sobre nós se inflama,
Vêde dos chicoronhos feitos valorosos
entre caputos feros e numerosos.

Os Sobas e os Lengas lembrados
que, do Austral planalto huilano,
por rios nunca dantes atravessados
passaram para além do mato africano
em feitiços e macas esforçados,
mais do que aguentava o querer humano,
e entre lusitanas gentes edificaram
Novo Sobado, que tanto sublimaram.

E também as lembranças gloriosas
daqueles pioneiros que foram calando
a sede da bulunga que em terras grandiosas
do Lubango e da Chibia andaram devastando,
e aqueles que por ressacas famosas
se foram da Lei da Morte libertando.
Cantando espalharemos por todo o lado
se a tanto nos levar o poético brado.

Cessem do tripeiro ferino
as brutezas grandes que houveram.
Cale-se dos alfacinhas e do coimbrão ladino
a fama das tradições académicas que tiveram,
que nós cantamos o peito ilustre macongino
a quem Baco e Cupido obedeceram.
Cesse tudo o que a Musa portucalense canta
que Outro clamor mais firme se alevanta.

Eis que o Novo Rei se mostrou
D. Saraiva de Oliveira, o primeiro
deste nome que ao Reino adiantou
colocar no caminho verdadeiro:
do tempo do Caprandanda já cantou
a tradição do Macongino inteiro.
O Soba de Aveiro e o Barão do Tchimpumpunhime
ousarão aumentar o Reino para lá do lime.

E o poderoso Rei, a quem do Planalto puro
foi da mapundeira tradição concedido
impor ao macongino povo seguro
nobres títulos que o farão conhecido
em todo este Continente duro.
E com seu porrinho real e temido
na magnífica Ceia investiu os novos sobados
aos filhos da Huíla nobilitados.

E disse: Ó macongino ousado, mais que quantos
no mundo souberam fazer académicas cousas,
tu, que por baptismos afogados, tais e tantos,
e por julgamentos vãos nunca repousas,
pois as sagradas cerimónias e quebrantos
como carrasco investir ousas,
que há tanto tempo o caloiro teme
que ainda não o sendo, já geme.

Pois são tão importantes os segredos escondidos
da nossa gente e do seu grande alento,
a nenhum outro humano concedidos
de nobres e de imortal merecimento.
Que os cavaleiros desta távola sejam espargidos
com o nompeque perfumado do sentimento
para poderem cantar a Huilana Terra
lá longe ferida por fratricida guerra.

1 Ninfas do Caculovar

Trovas do Exílio - IV

via PoeMaconge by noreply@blogger.com (José Jorge Frade) on 7/18/08
Da parte donde a noite vem morrendo
com Sines se avizinha; mas o rio
que do interior alentejano vai rompendo
enche a mulola onde o Vice-Rei teve frio
quando a tipóia real se ia perdendo
no tabaibal imenso do vasto senhorio.
O Baronete lembra-se já das arenosas
terras do Namibe, tão saudosas.

Pelo chão escondido a tipóia real
aos solavancos ia andando na terra dura
tão áspera eram as picadas, por sinal
bem próprias para tudo o que é aventura.
Envoltos todos na poeira fina do areal
anseiam já, esfomeados, pela mansão segura
onde o banquete com manjares desusados
apresenta chincúio, bacalhau e patos estufados.

O grão-Duque do Lubango determina
com palavras altas de Louvor
que um antigo macongino se destina
a ocupar um alto cargo de pendor:
Ministro Plenipotenciário será a sina
de quem até hoje foi Itinerante Embaixador.
Parido no Deixa-o-Resto por Decreto-Lei
espera-o a Fama e a Glória na nossa Grei.

Levantando-se D. Canduzeiro meneando
três vezes a cabeça branca e descontente,
a voz pesada aos poucos engrossando
vai chegando até nós solenemente.
E disse ao Secúlo de aspecto venerando
antes preferir ser Embaixador da plebeia gente
do que contentar o Vice-Rei com o ofício novo,
ser ministro de nobres e não do povo.

Lançando a mão de uma caixa que continha
suspiros de neve da D. Alexandra Portela
o Plenipotenciário Ministro como convinha
distribui os doces pelos nobres que amá-lo
passaram, porque na memória o gesto se retinha.
E as cornucópias do Gavino, ao recordá-lo
D. Saraiva d'Oliveira falou de sua fama
na Huíla, o Grão-Sobado que se proclama.

Também foi vista imagem acesa
de Moçâmedes, a flor d'areia se apartando
no corpo levando a Welwitchia presa
qual polvo verde da secura triunfando.
O namibeano deserto ia com firmeza
do corpo fresco do Planalto s'encostando
oferecendo sua fauna rica e diferente
num alambamento enorme ao Poente.

A Torres Vedras proclamou o Soberano
Mulemba Frondosa de copa rara
onde se refresca o sedento humano
e se banha na água doce e clara
aquele que veio do sertão africano.
Ali, onde o divino néctar molhara
num Oásis gargantas mil
dois meses iam para além d'Abril.

Vou cantando o Povo que se admira
por ter vencido a guerra que o assolou.
Mesmo em terra estranha as forças tira
do corpo que longos caminhos calcorreou
Neste ano que cem cacimbos o Lubango atira
ao Destino que duramente o marcou,
o Povo acalenta a dor nos maconginos braços
fortes na tradição dos chicoronhos Paços.

Vai de vira, ó vira, ó vira, ó vira
mas que grande e belo compinchão
que bem comporta e longe atira
na garganta seca o meu quinhão!
Primeiro camarada, ó vira, ó vira,
ó que calor, que gostosa sensação,
e o Baronete do Namibe compõe na lira
a canção que a Grã-Duquesa lhe pedira.

E agora, de nomes probos e de usança
novos e vários são os habitantes:
o Barão das Mornas o copo já avança
para o líquido de vapores estonteantes
e o "Príncipe dos Trovadores" lança
no pergaminho palavras ressonantes.
E a manhã foi nascendo sem cor
pois desmaiada estava já a poética flor.

Trovas do Exílio - V

via PoeMaconge by noreply@blogger.com (José Jorge Frade) on 7/18/08
Sempre eu cuidei, ó Grão-Duque poderoso
que, para as coisas da nossa gente,
eu estaria sempre lesto e operoso
a fazer estrofes, onde a poesia em corrente
fale das alegrias ou do caminho doloroso
que connosco vai seguindo obediente.
Assim do Reino cantarei o novo e o velho
como no Lubango ensinou D. Rui Coelho.

Na matutina luz, o Visconde de Maconge fazia
os Macongíadas de ilustre fama
enquanto a lua no céu da Huíla aparecia
aquecendo os corações em cálida chama.
O estudante da capa na noite surgia
para fazer uma serenata à meiga dama
que no colégio olhava da janela
para o Cristo-Rei, guardião da Chela.

Já pelo ar a imagem huilana bem voava
para no écran fixar a benesse
que o macongino no coração levava.
Com o olhar solto que não falece
a magia explode e o encanto ousava
colocar onde o pinheiro se enrijece
o mutiáti, a mupanda e o imbondeiro
e do manhéu o forte cheiro.

E disse mais D. António naquele momento
ter vendido por 17$50 o seu casaco santo
para poder ir à primeira Ceia, e o pensamento
refugiou-se no velho Liceu sacrossanto
onde as carecas dos caloiros doutro tempo
gemiam ao jugo dos veteranos de negro manto.
Viva a malta do chicoronho Liceu!
Viva a malta desse sonho que se não perdeu!

A noite ia passando, na festiva rota
com alegria de saudade misturada
por acharem os maconginos a terra tão remota
a nossa Huíla há tanto tempo abandonada.
Qualquer então consigo cuida e nota
ser caprandanda gente no Puto exilada
esta que aqui e agora canta e bebe
o vinho que desta terra gentia bem recebe.

Os filhos e companheiros de Tebano
que tão diverso néctar nos deixou
ouviram de seguida o discurso ufano
de quem palavras duras arremessou.
A Grã-Duquesa quebrara o "silêncio" insano
que o protocolo desde há muito fixara:
Pelas mulheres maconginas foi exigindo
que o facho do amor a todos fosse unindo.

Trovas do Exílio - VI

via PoeMaconge by noreply@blogger.com (José Jorge Frade) on 7/18/08
Quando a tarde passar, na comboiada frota
com grande alarido em verso cantada
achareis os maconginos que a tão remota
terra aveirense agora vão de abalada.
Qualquer então consigo cuida e nota
nos sobados a praxe mais ousada,
e como os que de fora do Reino cresceram
sem a força da tradição que outros conheceram.

Vede quantas carruagens nesta viagem
que fazemos, transportam as subidas
ideias que em outra distante paragem
foram pelos antigos veteranos concebidas.
E do primeiro comboio que passagem
faz agora por estas terras insofridas
nós faremos de improviso em tempo incerto
um épico canto sem limite certo.

Na Ceia-Grande de Aveiro se viu
velhas e novas gentes d'outra enseada
onde o Caculovar se enchia, nem outro rio
tanta fama logrou ver por si apartada.
O Duque do Chaungo tomado de súbito frio
à pipa do doce néctar deu uma olhada
pois a costa de corsários estava cheia
donde já se via latejar a tinta veia.

Os Sobas e Macotas liam já os sinais
que no fundo dos copos o macau deixava ver
e as libações a Baco eram cada vez mais
com o líquido santo sem parar de correr.
Lindos eram os olhos das Vestais
onde transparecia a felicidade de poder
abençoar os antigos Bispos do Liceu
onde, por tanto tempo, o chicoronho acorreu.

Os filhos do Mondego a capa escura
sobre os ombros trouxeram e cantaram
por memória eterna e mui segura
o fado de Coimbra que ali transformaram
em tributo precioso de fonte pura.
Agradeceram os maconginos e choraram
por ouvirem a balada e o fado com fervor
porque eram belos os versos de amor.

Levantando-se o estrangeiro rubicundo
a gaguejar na língua hispana
nos disse: A vós que sois d'outro Mundo
da longínqua e formosa terra angolana,
eu vos testemunho o prazer profundo
de quem vindo da pátria peruana
tanta amizade junta nunca viu
nem tão forte comoção sentiu.

Do Porto a embaixada com seus instrumentos
que pelos etéreos paços vão soando,
no Sobado tocam doces lamentos
que a todos vão suavemente reconfortando.
Um súbito silêncio atordoou os ventos
pois o Barão das Cordas Lisas murmurando
palavras muflas com súbita euforia
inseriu-as no fado com real mestria.

Trouxe o filho de Camuhóque do Céu
o fogo que acendeu no peito humano
quando de improviso a sala dele recebeu
as palavras do Guerrilheiro sem engano.
Assim o Soba comovido agradeceu
o novo título, e o Vice-Rei ufano
ordenou que para sempre a humana geração
recordasse essa nova e nobre condição.

O Barão do Tchimpumpunhime com a vaidade
que com equilíbrio lhe modela a fantasia
leva o Povo ao seu palácio onde a qualidade
da sua bela garrafeira surpreenderia
até o Deus Baco (oh! Leviandade!)
O líquido que borbulhar ali se via
era tanto e de tão estonteante sabor
como não havia em África, Pérsia e Cananor.

Vimos estar todo o Maconge determinado
em fazer de Aveiro terra gentia
um novo e distinto Ducado;
e ao seu Soba Grande, o valoroso Chibia,
Duque do Chaungo, ser-lhe dado
o título por mor de sua valentia.
Que os Trovadores cantem em lindo verso
por todo o Reino ora tão disperso.

E sendo assim, que a explosão da amizade
entre nós maconginos sempre aconteça,
pois estaremos prontos na adversidade
que por guerras à Grei se ofereça,
e o nosso Rei, D. César da Silveira, há-de
da parte incerta onde quer que permaneça
abençoar a nossa boa gente
em plaga estranha abandonada infamemente.

O Duque do Chaungo, forte ficara
imitando os antigos nobres na ousadia
de quem por bem já há muito experimentara
em Grandes Ceias que o tinto tingia
de rubra cor; e o muíla batucara
em honra do dilecto filho da Chibia,
e mais quando os do Lubango em vão tentarem
sorver mais do que ele, e longe ficarem.

A corneta de chifre de olongo num lamento
imagem da guerra fez nos ares;
o som bélico daquele instrumento
que os deuses africanos d'outros lares
abençoaram em feliz momento,
confundiu o caputo (nos seus) esgares
porque não compreendia o cerimonial novo
que ali fazia o macongino povo.

sexta-feira, 18 de julho de 2008

Trovas do Exílio - VII

via PoeMaconge by noreply@blogger.com (José Jorge Frade) on 7/18/08
Já se viam chegados todos à terra
que procurada já por tantos fora
porque duas Ceias já encerra
na sua história vencedora.
Ora, hoje já se vê com que guerra
irão comer a caldeirada de albacora
o macongino que chegado tem adiante
churrasco, arroz-doce e vinho abundante.

E, como a gente vinha a desejar
que o Soba d'Aveiro que ali s'assentava
fizesse o seu discurso a falar
como o Jonas que ali não estava,
fez-se silêncio para aquele começar
a palestra original que só ele ousava.
Todos como que acordados se sentiram
voando nos espaços donde fugiram.

Com a vista turva já olha a planura
das austrais terras que não se compadecem
de longe terem ficado na espessura
dos matos de mutiáte que reverdecem.
Assim se vê o huilano, que a ternura
tinge os gestos que ali permanecem,
perdido na franja da saudade ardente
espargida com vinho entre tanta gente.

O Plenipotenciário Ministro enfurecido
por Baco exigiu que se fizesse julgamento
ao bárbaro que ali se encontrava atrevido
porque não sendo do Reino, com alento
se assentava na mesa onde ceva com alarido
o macongino povo de tanto merecimento.
O Vice-Rei porque a capa negra não levou
o bárbaro Faustino no nosso seio aceitou.

Das muitas histórias que se contaram
à volta da grande mesa em ferradura
que no Deixa-o-Resto concertaram,
destacou D. Canduzeiro a certa altura
a dos churrascos que bem desossaram
num baile da Mapunda. A fartura
de ossos era tal que um cão esfomeado
em baixo da mesa foi logo colocado.

Depois da inesperada tempestade,
nocturna coca-cola que o milagre atento
veio transmudar em vínica qualidade,
a Grã-Duquesa discursou o atrevimento
da Morganda que na negra escuridade
quis envolver o seu real talento:
no Reino de Maconge sempre aconteceu
beber ela o que o Vice-Rei bebeu!

E como foi um corajoso acto
pediu por isso a Grã-Duquesa
que o poeta do Reino de facto
ali declamasse com arte e beleza
em honra de quem vindo do mato
ousara desafiar a realeza.
Em mufia cantou logo o trovador
sendo o Duque do Chaungo o tradutor.

Chegado era o momento prometido
em que o Grão-Duque já aguardava
que o Campino, à sua voz submetido,
se ouvisse como bem se esperava.
Sobre o trono se elevou comprido
e por cima de nós bem declamava
o ribatejano que ganhara fama
perdendo-a agora o bravo cuanhama.

Logo que a última sílaba do "Campino"
deixou de se ouvir na noite alta
e do touro ribatejano o trágico sino
deixou de tinir e se pôs em falta,
lançou-se o trovador como um felino
para o meio do salão onde estava a malta.
Saltou e dançou como um pastor muíla
em homenagem às gentes da Huíla.

Da terra africana lhe respondiam
as lembranças que na alma lhe moravam,
que sempre nos seus olhos traziam
quando de sua terra se apartavam.
Naquela noite que os canculas se ouviam
os gestos ritmados celebravam
as chanas onde os bois às centenas
eram pássaros de coloridas penas.

quarta-feira, 16 de julho de 2008

Poetas de Maconge

via PoeMaconge by noreply@blogger.com (José Jorge Frade) on 7/14/08
Hoje lembrarei
Alguns mui finos
Bem dados à grei,
Bardos Maconginos.

D. Rui Ferreira Coelho,
D. Cesar Paulo da Silva,
Gloriosos e de selho,
Da epopeia viva.

Que as Macongíadas
Desses Principes dos Poetas
Ao Povo sejam lidas,
Lhes sejam descobertas.

D. Jorge Arrimar,
Em "Trovas do Exílio",
Quão fino relatar
De poeta exímio.

Bardo do Reino,
Há tempos ungido,
Verseja com treino
Em jeito antigo.

Emílio Leite Velho,
Digno Cantor Real,
É assunto sério,
Macongino leal.

E outros tantos
De quem vou falar,
Poetas quantos
Me possa lembrar.

O Paiva de Carvalho
Ilustra os poemas
Em telas de trabalho
Sublime... apenas.

Poeta Zé Frade,
Tanto p'ra dizer,
Tem musicalidade,
Sabe bem escrever.

José Luis Higino,
Versada escorreita.
É um desatino,
Fá-la bem feita.

Henrique (Higino) Vieira,
Rico Soba de Faro,
De rima verdadeira,
Em poeta mui raro.

Esperança Traguedo,
Das terras do Quipungo,
Troxe-nos folguedo
De amar o mundo.

Maria Teresa Marques,
Em sua "Quitandeira":
Som, odor e cor; artes.
Canta, de que maneira...

Adriana Nobre Simões,
Poemas disfarçados,
Sentir de corações,
Muito, muito amados.

D. Carlos Painho,
João Manjericão,
Um é trovadorinho,
Outro um poetão.

Inês Sousa Gomes,
Dito assim, quem é?
Se Maria do Céu pomos,
Geo. prof. pois é.

Necas, o Soba,
Suzete poetisa.
Dos dois a obra?
Muito bem, trisa.

O Pipo - João Simões,
O Timam - T. Homem,
"Nos capim danadões"
As musas não dormem.

Hugo de Sousa,
Rui Correia de Freitas,
Dum, fados que ousa,
Doutro, rimas bem feitas.

Da Adélia Vaz,
Que bela poesia.
Da Maria da Paz,
Sublime melodia.

Da Nélia Godinho,
Rimas de carinho.
Da Graça Arrimar,
Amar de mansinho.

Poetas há, muitos mais,
De pena singela.
São em nossos anais,
De poética mui bela.

E dos que não falei,
Puro esquecimento
Dos nomes, não sei,
P'ra meu tormento.

Viva Maconge,
Viva Huila,
Viva longe
Se não é Muhuila.

Requerimento para D. Necas Carvalho

via PoeMaconge by noreply@blogger.com (José Jorge Frade) on 7/14/08
Na Austrália está a Geninha a resmungar,
Em Luanda a Té e o Zito, zangados,
Em Toronto, o Pintor-Mor a praguejar,
Na Huíla, o Funka e o Ramiro, passados.

-Então esse Necas, lá no Puto,
Que raio de máquina arranjou?
-É máquina bestial, ou de bruto?
-Em que feira é que a comprou?

O Higno no "site" botou a prosa,
E as fotos nunca mais aparecem,
Será que o rôlo saiu côr de rosa?

Dom Necas: P'rós que esmorecem
Trate lá das fotos p'rá Galeria
Para verem, da Ceia do Porto, a alegria.

Al otro lado

Al otro lado me dijeron
los viejos se van convirtiendo en árboles
viejos también sin hojas en el lado del sol
aguardando sin saber qué, mudos.

Pero súbitamente un árbol cualquiera
siente subir dentro de él la savia de un sueño
al borde de la muerte ya, pero todavía
tibio como la leche de la madre.

El sueño va subiendo por las venas del árbol
una vida entera que pasa
hasta hacerse pájaro en una rama
un pájaro que recuerda, canta y se marcha
poco antes de que todos los árboles mueran.

Si yo me hago árbol viejo al otro lado del río
y me toca ser el árbol que recuerda y sueña
puedes estar bien segura que soñaré contigo

con tus ojos grises como el alba
y con tu sonrisa
con la cual se vistieron los labios de los rosales
en los días mas felices.

Fonte: Blogue "Poemas del Alma"

terça-feira, 15 de julho de 2008

A Sá da Bandeira



Fonte: Real República de Maconge
http://www.geocities.com/SouthBeach/Jetty/9543/


A Sá da Bandeira

Detenho-me a cismar e nunca mais atino
Porque há contradições de forma singular;
Como o tempo veloz, a ti, faz remoçar
E a mim me torna velho, a mim que era menino.

Chorava qulaquer outor a lei deste destino
Mas eu juro que não, talvez por te adorar.
Queor ver-te crescer, formosa, de encantar
Assim moça gentil, de trato lhano e fino.

Hei-de sempre sentir a sombra dos teus passos
Até que a morte venha desfaz
Que unem alma e corpo e dão expressão à vida!

Se a cidade puder levar nos olhos meus
Não háde custar tanto o derradeiro adeus,
Não háde ser tão triste a nossa despedida

Angola, 1957

quinta-feira, 10 de julho de 2008

Gostava de vos falar / dos esquecidos

Gostava de vos falar
dos esquecidos,
dos heróis que a história
não narra,
que as viúvas choraram
mas já não recordam,
daqueles
que nem tempo tiveram
de ter filhos
que os amassem,
descendentes
que os lembrassem,
daqueles
que nunca tiveram
o dia do pai,
vítimas de guerras
que não inventaram,
em tempo que já lá vai;
falar deles é prevenir,
se bem que de nada lhes valha,
de guerras que possam vir,
geradas pela ambição
dos que nunca morrerão
num campo de batalha.

[s/d nem local, possivelmente escrito em Mampatá, no sul da Guiné, c.1972/74]
Fonte. Blogue "Luís Graça e Camaradas da Guiné" - post de 10Jul2008

quarta-feira, 9 de julho de 2008

Um sorriso...mãe

Mãe
se não regressar
lembra-te do meu sorriso
aquele sorriso malandro
a mendigar o perdão
para me não castigares
por ter faltado às aulas
para ir p'ró rio nadar
oh
como era bom nadar
da fraga do cavalo saltar
o Douro atravessar
e as uvas apanhar
e depois
chegar a casa
com um sorriso para te dar.

Mampatá 1973

segunda-feira, 7 de julho de 2008

Viagem

Aparelhei o barco da ilusão
E reforcei a fé de marinheiro.
Era longe o meu sonho, e traiçoeiro
O mar...
(Só nos é concedida
Esta vida
Que temos;
E é nela que é preciso
Procurar
O velho paraíso
Que perdemos.)

Prestes, larguei a vela
E disse adeus ao cais, à paz tolhida.
Desmedida,
A revolta imensidão
Transforma dia a dia a embarcação
Numa errante e alada sepultura...
Mas corto as ondas sem desanimar.
Em qualquer aventura,
O que importa é partir, não é chegar.

Fonte: Blogue "Hipnoz" - post de 07Jul2008

domingo, 6 de julho de 2008

ORILLAS DEL SAR

A través del follaje perenne
Que oír deja rumores extraños,
Y entre un mar de ondulante verdura,
Amorosa mansión de los pájaros,
Desde mis ventanas veo
El templo que quise tanto.

El templo que tanto quise...
Pues no sé decir ya si le quiero,
Que en el rudo vaivén que sin tregua
Se agitan mis pensamientos,
Dudo si el rencor adusto
Vive unido al amor en mi pecho.

Fonte: Blogue "Poemas del Alma"

HORA TRAS HORA, DÍA TRAS DÍA

Hora tras hora, día tras día,
Entre el cielo y la tierra que quedan
Eternos vigías,
Como torrente que se despeña
Pasa la vida.

Devolvedle a la flor su perfume
Después de marchita;
De las ondas que besan la playa
Y que una tras otra besándola expiran
Recoged los rumores, las quejas,
Y en planchas de bronce grabad su armonía.

Tiempos que fueron, llantos y risas,
Negros tormentos, dulces mentiras,
¡Ay!, ¿en dónde su rastro dejaron,
En dónde, alma mía?

Fonte: Blogue "Poemas del Alma"

Era apacible el día

Era apacible el día
Y templado el ambiente,
Y llovía, llovía
Callada y mansamente;
Y mientras silenciosa
Lloraba y yo gemía,
Mi niño, tierna rosa
Durmiendo se moría.
Al huir de este mundo, ¡qué sosiego en su frente!
Al verle yo alejarse, ¡qué borrasca en la mía!

Tierra sobre el cadáver insepulto
Antes que empiece a corromp-erse... ¡tierra!
Ya el hoyo se ha cubierto, sosegaos,
Bien pronto en los terrones removidos
Verde y pujante crecerá la yerba.

¿Qué andáis buscando en torno de las tumbas,
Torvo el mirar, nublado el pensamiento?
¡No os ocupéis de lo que al polvo vuelve!...
Jamás el que descansa en el sepulcro
Ha de tornar a amaros ni a ofenderos
¡Jamás! ¿Es verdad que todo
Para siempre acabó ya?
No, no puede acabar lo que es eterno,
Ni puede tener fin la inmensidad.

Tú te fuiste por siempre; mas mi alma
Te espera aún con amoroso afán,
Y vendrá o iré yo, bien de mi vida,
Allí donde nos hemos de encontrar.

Algo ha quedado tuyo en mis entrañas
Que no morirá jamás,
Y que Dios, porque es justo y porque es bueno,
A desunir ya nunca volverá.
En el cielo, en la tierra, en lo insondable
Yo te hallaré y me hallarás.
No, no puede acabar lo que es eterno,
Ni puede tener fin la inmensidad.

Mas... es verdad, ha partido
Para nunca más tornar.
Nada hay eterno para el hombre, huésped
De un día en este mundo terrenal,
En donde nace, vive y al fin muere
Cual todo nace, vive y muere acá.

Fonte: Blogue "Poemas del Alma"

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