via nonas de nonas em 05/05/09
CARTA A RUY ALVIM
Conheci-te na nossa mocidade:
Rapazes do liceu
A estudar e a gozar numa antiga cidade.
O mais novo eras tu.
O mais velho era eu.
Naquele tempo havia Portugal.
Falava-se de Império.
(Quem lhe soubera, então, o trágico final!)
E governava um Homem sábio e sério.
À jovem convivência a vida separou-a:
Tu foste pra Coimbra, pra Direito.
E eu pra Lisboa, lidando em tudo pra que tinha jeito.
Tu foste Presidente da Briosa,
Tiveste cargos de relevo no país.
Eu ia-me elevando em verso e prosa,
Numa ascensão feliz.
Quando avançou Abril com bandeiras de sangue,
Veio agredir-te o ódio triunfal
Que te levou exangue,
ao leito de Hospital.
Eu sofria a derrota do sonho português
Sagrando-me soldado
Do verso, que me fez
Defensor do Passado.
Foste exilar-te no Brasil,
Onde nasceste,
Para evitar a horda vil
Mortal como uma peste.
Amparou-te o espírito a Poesia
E a força da razão.
Até que um dia
Regressaste ao escasso deste chão.
Eu recebi-te num fraterno abraço,
Com alegria e com alívio,
A reatar o laço
Do convívio.
Mas o teu corpo voltou doente,
Cedido pela mais cruel doença.
E, lentamente,
eu perco a tua cordial presença.
Visitei-te numa Casa de Saúde,
Para dizer-te adeus e tu a mim.
E vejo que o teu mal já não ilude,
Pois, três dias depois, chegaste ao fim.
Choro com todos os teus amigos,
O sofrimento da tua ausência,
Hoje, mendigos,
do teu coração e inteligência.
E, agora, Ruy, é a maior saudade que me dói
A do jovem que foste,
A do jovem que fui,
Num Portugal que foi.
14.04.2009 - António Manuel Couto Viana
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