quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Neologismo

Beijo pouco, falo menos ainda.
Mas invento palavras
que traduzem a ternura mais funda
E mais cotidiana.
inventei, por exemplo, o verbo teadorar.
Intransitivo
Teadoro, Teodora.



Petrópolis, 25 de Fevereiro de 1947
Fonte: Brasil Escola - post "Criações lexicais"

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

AS GAROTAS DO MAR

Todos ficaram sabendo
que assim mesmo é que isto é,
contra as garotas do Mar
é remar contra a maré...

Vencemos em toda a linha!
Foi vitória das mais lindas,
pois nós ganhamos a todas,
Preciosas, Caraslindas...

Contra o que muitos pensavam
nós vencemos o despique,
pois entre ondas de beleza
não podemos ir a pique.

Que as moças iam vencer
era aqui por nós sabido,
pois o Namibe jamais
em beleza foi vencido!

Ninguém nos pode tirar,
cá nesta terra angolana
no campeonato das lindas
a posição soberana.

Todos queriam com bairrismo,
do fundo do coração,
neste Concurso famoso,
a bela repetição.

Lurdes tu és segunda
(Riquita foi a primeira)
e as Miragens do Deserto
hão-de indicar a terceira.

Em loucura colectiva,
no momento final,
a alegria sem limites
dominou a Areal.

Muitos cortejos de carros!
Bancos, pretos... Da cama,
homens, mulher's, crianças,
vêm pr'a rua de pijama!

As Welwistchias ajudaram,
com mil palmas prazenteiras,
que deram com frenezi,
as mil palmas das palmeiras!

E o bom Mar que é nosso Amigo,
em vozes portentosas,
bradou logo o mundo inteiro:
-São nossas as mais formosas!

Fonte: Blogue "GENTE DO MEU TEMPO" - post de 18Out2011

domingo, 23 de outubro de 2011

RECADO

Viver a vida a sorrir,
sem travar receios...
acreditar no provir,
sem olhar a meios...

um fugaz recado...
um ténue raio de luz,
duma auréloa, pressuposta,
à jornada, que conduz,
com ou sem mácula-pecado,
ao túnel duma resposta...
encontros de sabores...
viagem ou pura jornada,
curta ou larga d'amores,
numa vontade pujada...

réstea de luminosidade,
desventrando espaço tal,
a dar eco à AMIZADE...
acre-doce... ou sabor-sal

em caminhos cruzados,
a dar rumo, projectar,
em passos desusados
viver... O VIVER a sonhar!!!

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Cristalizações

Faz frio. Mas, depois duns dias de aguaceiros,
Vibra uma imensa claridade crua.
De cócaras, em linha os calceteiros,
Com lentidão, terrosos e grosseiros,
Calçam de lado a lado a longa rua.

Como as elevações secaram do relento,
E o descoberto Sol abafa e cria!
A frialdade exige o movimento;
E as poças de água, como um chão vidrento,
Reflectem a molhada casaria.

Em pé e perna, dando aos rins que a marcha agita,
Disseminadas, gritam as peixeiras;
Luzem, aquecem na manhã,
Uns barracões de gente pobrezita
E uns quintalórios velhos, com parreiras.

Não se ouvem aves; nem o choro duma nora!
Tomam por outra parte os viandantes;
E o ferro e a pedra - que união sonora! -
Retinem alto pelo espaço fora,
Com choques rijos, ásperos, cantantes.

Bom tempo. E os rapagões, morosos, duros , baços,
Cuja coluna nunca se endireita,
Partem penedos. Voam-lhe [sic] estilhaços.
Pesam enormemente os grossos maços,
Com que outros batem a calçada feita.

A sua barba agreste! A lã dos seus barretes!
Que espessos forros! Numa das regueiras
Acamam-se as japonas, os coletes;
E eles descalçam com os picaretes
Que ferem lume sobre pederneiras.

E neste rude mês, que não consente as flores,
Fundeiam, como esquadra em fria paz,
As árvores despidas. Sóbrias cores!
Mastros, enxárcias, vergas! Valadores
Atiram terra com as largas pás...

Eu julgo-me no Norte, ao frio - o grande agente!
Carros de mão que chiam carregados,
Conduzem saibro, vagarosamente;
Vê-se a cidade, mercantil, contente:
Madeiras, águas, multidões, telhados!

Negrejam os quintais; enxuga a alvenaria;
Em arco, sem as nuvens flutuantes,
O céu renova a tinta corredia;
E os charcos brilham tanto que eu diria
Ter ante mim lágoas de brilhantes!

E engelhem muito embora, os fracos, os tolhidos,
Eu tudo encontro alegremente exacto,
Lavo, refresco, limpo os meus sentidos.
E tangem-me, excitados, sacudidos,
O tacto, a vista, o ouvido, o gosto, o olfacto!

Pede-me o corpo inteiro esforços na friagem
De tão lavada e igual temperatura!
Os ares, o caminho, a luz reagem;
Cheira-me a fogo, a sílex, a ferragem;
Sabe-me a campo, a lenha, a agricultura.

Mal encarado e negro, um pára enquanto eu passo;
Dois assobiam, altas as marretas
Possantes, grossas, temperadas de aço;
E um gordo, o mestre, com ar ralaço
E manso, tira o nível das valetas.

Homens de carga! Assim as bestas vão curvadas!
Que vida tão custisa! Que diabo!
E os cavadores descansam as enxadas,
E cospem nas calosas mãos gretadas,
Para que não lhes escorregue o cabo.

Povo! No pano cru rasgado das camisas
Uma bandeira penso que transluz!
Com ela sofres, bebes, agonizas;
Listrões de vinho lançam-lhe divisas,
E os suspensórios traçam-lhe uma cruz!

De escuro, bruscamente, ao cimo da barroca,
Surge um perfil direito que se aguça;
E ar matinal de quem saiu da toca,
Uma figura fina, desmboca,
Toda abafada num casaco à russa.

Donde ela vem! A actriz que tanto cumprimento
E a quem, à noite, na plateia, atraio
Os olhos lisos como polimento!
Com seu rostinho estreito, friorento,
Caminha agora para o seu ensaio.

E aos outros eu admiro os dorsos, os costados
Como lajões. Os bons trabalhadores!
Os filhos das lezírias, dos montados:
Os das planícies, altos, aprumados;
Os das montanhas, baixos, trepadores!

Mas fina de feições, o queixo hostil, distinto,
Furtiva a tiritar em suas peles,
Espanta-me a actrizita que hoje pinto,
Neste Dezembro enérgico, sucinto,
E nestes sítios suburbanos, reles!

Como animais comuns, que uma picada esquente,
Eles, bovinos, másculos, ossudos,
Encaram-na, sanguínea, brutamente:
E ela vacila, hesita, impaciente
Sobre as botinas de tacões agudos.

Porém, desempenhando o seu papel na peça,
Sem que inda o público a passagem abra,
O demonico arrisca-se, atravessa
Covas, entulhos, lamaçais, depressa,
Com seus pezinhos rápidos, de cabra!

Nota: neste poema Cesário Verde homenageia o calceteiro.
Fonte: Rua da Poesia

segunda-feira, 25 de julho de 2011

Minha Terra Longe

Infinitamente
Observo o Sul
e imagino-me na Minha Terra Longe

A minha Terra Longe
Está para além do mar
E de todo um continente

Imagino-me nela, penetro nela mas...
não encontro a escola que frequentei
as ruas que percorri
as casas que habitei
as cidades onde brinquei

não vejo os amigos
não encontro os vizinhos

Reconheço os lugares
pelos espectros do que a minha Terra foi

Há lá uma outra gente, uma outra humanidade
Gente que nada me diz

A minha terra Longe
Já não a reconheço
Não tenho chão, apagam-se as raízes
Resta a saudade da Pátria que foi
E a mágoa e a dor da Pátria que perdi


Rui Moio - 28Set2004

quarta-feira, 20 de julho de 2011

Sentir o Império

Cheira a Império
No Rossio
No terreiro do Palácio de Almada


Era assim na minha Terra
E em todo além-mar
Onde havia Portugal


Cheira a Império
No centro de Odivelas
Nos autocarros, no metro 
À noite
Aos Sábados, aos Domingos.
A qualquer dia e hora
No colorido das pessoas
No vozear misturado
Nas roupagens exóticas...


Cheira a Império
No Restelo, nos Anjos
Nos nomes das ruas e praças
No olhar o Tejo
Nos Olivais
E em tantos outros bairros


Cheira a Império
Nas obras a fazer
E nos monumentos construídos
Há tantas pedras que nos falam dele
As dos Jerónimos, as da Torre de Belém
As estradas, as pontes, os palácios
O Jardim Colonial e tanta outra coisa mais


Cheira a Império
no aeroporto
Com tanto viajante
De outros continentes
que chegam e partem
a todo o momento


Cheira a Império
Na polícia, no exército, na marinha
No desporto
Na CP, nos eléctricos
Na Justiça
Na Câmara de Lisboa


Mas,
O Império descasou-se
Já não existe mais
Dantes o nome Portugal
Era em todo o mundo
Agora,
Neste vazio de derrota
há uma amostra
do Império todo
No pequenino Portugal


Ainda bem que assim é
Para todos
Para a última geração do Império
A que não traíu e foi tão sacrificada
pela outra parte dela
Que matou a Pátria e a Nação.

Nota. Poema concebido a 03Maio2008.

sábado, 2 de julho de 2011

Sentires Sentidos - visitas por países de Mai2009 a Jul2011

Clica na Imagem para a ampliar

Nota:
1 - O Brasil é 100 vezes maior que a ex-metrópole, ou seja, é 100 vezes maior que o Portugal actual. Assim, não admira que dali venha o maior parte das visitas. As visitas oriundas do Brasil são em dobro das que vieram de Portugal continental e ilhas adjacentes - 14 823 do Brasil e 7 672 de Portugal.

2 - Por ordem decrescente os visitantes do Sentires Sentidos são oriundos do Brasil, Portugal, Estados Unidos, Suécia, Alemanha, Angola... 
Curioso o posicionamento dos Estados Unidos. Julgo que isto se deve à grande comunidade de língua portuguesa que vive na América.
A Suécia aparece em 4º. lugar, depois dos Estados Unidos. Ora, na Suécia não há uma grande comunidade de portugueses nem há tradição histórica de relações próximas entre a Suécia e  Portugal. Este posicionamento não será devido a, eventualmente, haver naquele país uma grande comunidade de falantes de português e isto devido ao incremento das trocas comerciais entre a Suécia e os novos países da CPLP?

3 - Angola aparece em 6º. lugar, bem à frente de qualquer outro país da comunidade lusófona, à excepção do Brasil e do Portugal actual.

Rui Moio
Fonte: estatistica do Blogger.com

quarta-feira, 29 de junho de 2011

As visitas ao Sentires Sentidos por mês de Mai2009 a 28Jun2011


Clique na imagem para a ampliar

Nota: O gráfico desenha o número de visitas realizadas ao Sentires Sentidos por mês desde Mai2009 a 28Jun2011. Abaixo indico alguns dados numéricos referentes a dois meses:

Jul2010         -  3036
1-28Jun2011 -  3281

Os países que mais visitaram o Sentires Sentidos foram o Brasil, seguido de Portugal Continental. Em menor número o Sentires Sentidos recebeu as visitas dos Estados Unidos da América, Angola, Rússia...
Rui Moio
Fonte: estatisticas do Blogger.com

terça-feira, 28 de junho de 2011

As visitas do mundo ao Sentires Sentidos - De 28Mai2008 a 27Jun2011


Clique na imagem para a ampliar

Nota: Neste gráfico mostram-se os países de todo o mundo que visitaram o Sentires Sentidos de 28Mai2008 a 27Jun2011. A mancha verde cobre quase todo o planisfério. Todas as parcelas do mundo lusófono já o visitaram.
Rui Moio

Fonte: Google Analitycs

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Balanço

Contei meus anos
e descobri que terei menos tempo para viver daqui para a frente
do que já vivi até agora.


Tenho muito mais passado do que futuro.
Sinto-me como aquele menino que recebeu uma bacia de cerejas.
As primeiras, ele chupou displicente, mas
percebendo que faltam poucas, rói o caroço.


Já não tenho tempo para lidar com mediocridades.
Não quero estar em reuniões onde desfilam egos inflamados.
Inquieto-me com invejosos tentando destruir quem eles admiram,
cobiçando seus lugares, talentos e sorte.
Já não tenho tempo para conversas intermináveis,
para discutir assuntos inúteis sobre vidas alheias
que nem fazem parte da minha.


Já não tenho tempo para administrar melindres de pessoas,
que apesar da idade cronológica, são imaturos.
Detesto fazer acareação de desafectos que brigaram pelo
majestoso cargo de secretário geral do coral.
As pessoas não debatem conteúdos, apenas os rótulos.
Meu tempo tornou-se escasso para debater rótulos, quero a essência,
minha alma tem pressa...


Sem muitas cerejas na bacia, quero viver ao lado de gente humana,
muito humana; que sabe rir de seus tropeços,
não se encanta com triunfos,
não se considera eleita antes da hora,
não foge de sua mortalidade.


Caminhar perto de coisas e pessoas de verdade,
O essencial faz a vida valer a pena.
E para mim, basta o essencial (...)

Fonte. Blogue "A Lua some e o Sol volta novamente" - post de 24Jan2011

domingo, 26 de junho de 2011

O Banquete

Pela manhã sem dores
Nem afazeres de urgência
Tenho um mata-bicho de garfo.
Um ovo estrelado
Embebido em açucar e azeite
Pão quentinho, tiborna
Torradinhas pequeninas ou de pão de forma
Queijinho da serra
Manteiga com sal
Leite creme com chocolate
Chouriço quente acabadinho de assar
Chouriço negro, broa de milho
Queijinho fresco às fatias
Com pimenta e sal refinado
Uma gemada
Com muito açúcar
Linguiça assada e quentinha.
Numa tacinha
Salgadinhos de ginguba e castanha assada.


Ao almoço com a barriga vazia
Sai um caldo verde
Com um fio de azeite e rodelas de chouriço.
Segue-se um bife com todos
Batatinhas quentes, arroz, fiambre
Molho de tomate
Ou à Portugália
Um pires com polvo em molho de vinagrete
Ou camarão descascado em molho de tomate
Entradas em toda a parte
Ovos cozidos com pimenta
Pastelinhos de nata com canela
Pedacinhos de omeleta em palito
Azeitonas verdes de cortar à faca
Pistachos, Ginguba e caju
Regado com vinho de várias marcas
Verde e fresquinho.


À sobremesa
Um pudim de leite
Mousse de chocolate, brigadeiros
Leite creme com farófias
Papas de milho
Café quentinho com um cheirinho
E Tudo ao som de marchas
Que fazem saltar as emoções
E ficar com pele de galinha.

Rui Moio, 18 de Abril, às 17h30 na cervejaria Aguiar & Almeida

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Onde está DEUS?


Passavam carregados os camiões
Levavam carga pesada
Emparedada em grades.
Rangeres de carroçaria denunciavam
Na noite escura
Que a carga se movimentava.

Que carga era? perguntava.

Aproximei-me,

Eram animais brancos,
Bois ou porcos,
Não sei.
Na carroçaria de dois andares
Apertados, lado a lado,
De traseiras para fora,
Escondiam-se os olhos da estrada.

No andar superior,
Uns olhos
Acompanhavam-me tristes,
Talvez a suplicar
Um carinho, um milagre,
Ou então…
Já sabidos do destino
Perguntavam-me,
Onde está DEUS?

E eu, negro,
Relembrei com amargura
O meu viver de séculos.
Era assim no barco negreiro.

Eles não comem o pó da estrada
e eu não conheci o sabor do sal do mar.

Nessa altura
Com olhos mudos e tristes
Eu perguntava
A padres
e a meninas de bem,
Onde está DEUS?

Tal como estes
que agora são transportados
também fomos levados
sem alma
medidos pela carcaça
por partes ou por inteiro.

Rui Moio entre as 24h00 e a 1h00 da madrugada de 22Agosto de 2007

El-Rei D. Sebastião

Jovem e belo
Com o seu séquito luzidio
Veio a mim
Em seu cavalo branco
El-Rei D. Sebastião


Visitou-me como súbdito
Entrou no meu cantinho
Sentou-se diante de mim
E perguntou:
Como vai Portugal?


Eu não contava
Que El-Rei me falasse assim.


Refeito do choque
Aquietado pela serena quietude
Deste Rei-Deus
Balbuciei palavras sem nexo
Pensando que ele não soubesse
Como vai o nosso País.
Mas, El-Rei serenou-me:


- Eu vim aqui dizer-te
Que não te amoles
Se puderes alerta o nosso povo
De que eu ainda não morri.


Lembra-lhes a nossa História
Fala-lhes de Alcácer-Quibir
E tenham fé, tenham esperança
Porque quando o tempo chegar
Eu vou estar convosco, aí.


Rui Moio – 24Jan2008. Elaborado pelas 20h00 no café Skipper, em Odivelas.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

Esta tábua velha...

Esta tábua velha…
É dum vermelho vivo
Pela primeira vez pintada à pistola
Com a cor do sangue da bandeira
E do vigor da resistência

Veio de África
Por sorte não ficou na estrada
Subiu ao convés do último navio

Não é de madeira tropical
É de tábuas e aglomerado
Foi embrulho dos restos de três gerações
De militares e governadores

Saiu-se bem
Não se esfrangalhou
No embrulho pregado à pressa
E não se estragou das chuvas de dois invernos
Foi bancada
Nela mediram-se resistências e tensões

Em África e no exílio
Mostrou força e engenho
Agora o resto da tábua
Que tanta História tem
Vai ser prateleira e estante
De recortes de notícias
Com três e 4 décadas de passado
Desde o tempo
Que de repente
Serviu de tábua de salvação
Dos restos de três gerações

Nota: Poema elaborado pelas 18h45 de 02 de Junho de 2008 no café Latina Real, na Avenida 5 de Outubro, em Lisboa.

quarta-feira, 22 de junho de 2011

BALANÇO

via Africandar by Leston Bandeira on 11/17/10

Encalho nas palavras,
engadanham-se-me as mãos,
tropeço nas ideias.
Sinto à minha volta o vazio:
Um sopro de vento mais forte ou um simples gesto
Limpou tudo.
O frenesim continua na memória,
Apenas!
Projectos e ideias,
A luz com que enchia as casas e as cabeças dos amigos.
Hoje é o desespero da desesperança
Do dia de amanhã.
A fatalidade de viver onde não conheço ninguém e só identifico algumas árvores.
As pessoas da minha vida
Estão nos caminhos e nos desvios
Percorridos em anos atrás de anos,
Contados como dias ou horas.
Nunca evitei uns e outros.
A memória viva de mim próprio é clara:
Eu, a crescer, a envelhecer.
E os outrros
As imagens deles, vividas em mim e comigo,
A povoarem os meus dias,
Mesmo os ausentes e os fugitivos
Num balanço de uma vida desaparecida
Pela que quero continuar a estar,sendo.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Soneto a São José

via BATUQUES DO NEGAGE by rotivsaile on 3/18/11
SONETO A SÃO JOSÉ
*
Vivendo com Jesus e com Maria,
José ensina-nos a viver bem...
...vivamos, dia a dia, nós também
em tão feliz e doce companhia
.
O plano do Senhor, ele o aceitou
com muita fé e plena liberdade.
E sempre, com Deus Pai, colaborou
fazendo, com amor, Sua vontade.
.
Trabalhou pelo pão de cada dia
e, na mais amorosa doação,
serviu Jesus e a Mãe, Virgem Maria
.
São José foi na terra um peregrino
caminhando, em silêncio e oração,
na presença de Deus, feito Menino.

Chipala

Tinha face,
Havia cabelos, olhos em perfil
Nariz, boca.
Era uma presença.
Pensei que fosse para sempre
Que estava ali,
E eu, descuidado, não guardei.


Um dia
A chipala foi-se
Desapareceu
Deixámos de a ver.
Sei, sabemos que está lá.
Ficou a presença
Na forma de um girassol.


Irremediavelmente
E para sempre
Eu,
Nós todos,
Perdemos a chipala
Já não a vemos mais.


OBS: Chipala significa cara ou face em língua Nhanheca (sul de Angola). 

Rui Moio, poema elaborado mentalmente nos dias 4 e 5 de Fevereiro de 2010.

terça-feira, 24 de maio de 2011

Ode triunfal

À dolorosa luz das grandes lâmpadas eléctricas da fábrica
Tenho febre e escrevo.
Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto,
Para a beleza disto totalmente desconhecida dos antigos.

Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r-r eterno!
Forte espasmo retido dos maquinismos em fúria!
Em fúria fora e dentro de mim,
Por todos os meus nervos dissecados fora,
Por todas as papilas fora de tudo com que eu sinto!
Tenho os lábios secos, ó grandes ruídos modernos,
De vos ouvir demasiadamente de perto,
E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um excesso
De expressão de todas as minhas sensações,
Com um excesso contemporâneo de vós, ó máquinas!

Em febre e olhando os motores como a uma Natureza tropical -
Grandes trópicos humanos de ferro e fogo e força -
Canto, e canto o presente, e também o passado e o futuro,
Porque o presente é todo o passado e todo o futuro
E há Platão e Virgílio dentro das máquinas e das luzes eléctricas
Só porque houve outrora e foram humanos Virgílio e Platão,
E pedaços do Alexandre Magno do século talvez cinquenta,
Átomos que hão-de ir ter febre para o cérebro do Ésquilo do século cem,
Andam por estas correias de transmissão e por estes êmbolos e por estes volantes,
Rugindo, rangendo, ciciando, estrugindo, ferreando,
Fazendo-me um acesso de carícias ao corpo numa só carícia à alma.

Ah, poder exprimir-me todo como um motor se exprime!
Ser completo como uma máquina!
Poder ir na vida triunfante como um automóvel último-modelo!
Poder ao menos penetrar-me fisicamente de tudo isto,
Rasgar-me todo, abrir-me completamente, tornar-me passento
A todos os perfumes de óleos e calores e carvões
Desta flora estupenda, negra, artificial e insaciável!

Fraternidade com todas as dinâmicas!
Promíscua fúria de ser parte-agente
Do rodar férreo e cosmopolita
Dos comboios estrénuos,
Da faina transportadora-de-cargas dos navios,
Do giro lúbrico e lento dos guindastes,
Do tumulto disciplinado das fábricas,
E do quase-silêncio ciciante e monótono das correias de transmissão!

Horas europeias, produtoras, entaladas
Entre maquinismos e afazeres úteis!
Grandes cidades paradas nos cafés,
Nos cafés - oásis de inutilidades ruidosas
Onde se cristalizam e se precipitam
Os rumores e os gestos do Útil
E as rodas, e as rodas-dentadas e as chumaceiras do Progressivo!
Nova Minerva sem-alma dos cais e das gares!
Novos entusiasmos de estatura do Momento!
Quilhas de chapas de ferro sorrindo encostadas às docas,
Ou a seco, erguidas, nos planos-inclinados dos portos!
Actividade internacional, transatlântica, Canadian-Pacific!
Luzes e febris perdas de tempo nos bares, nos hotéis,
Nos Longchamps e nos Derbies e nos Ascots,
E Piccadillies e Avenues de L'Opéra que entram
Pela minh'alma dentro!

Hé-lá as ruas, hé-lá as praças, hé-lá-hô la foule!
Tudo o que passa, tudo o que pára às montras!
Comerciantes; vários; escrocs exageradamente bem-vestidos;
Membros evidentes de clubes aristocráticos;
Esquálidas figuras dúbias; chefes de família vagamente felizes
E paternais até na corrente de oiro que atravessa o colete
De algibeira a algibeira!
Tudo o que passa, tudo o que passa e nunca passa!
Presença demasiadamente acentuada das cocotes
Banalidade interessante (e quem sabe o quê por dentro?)
Das burguesinhas, mãe e filha geralmente,
Que andam na rua com um fim qualquer;
A graça feminil e falsa dos pederastas que passam, lentos;
E toda a gente simplesmente elegante que passeia e se mostra
E afinal tem alma lá dentro!

(Ah, como eu desejaria ser o souteneur disto tudo!)

A maravilhosa beleza das corrupções políticas,
Deliciosos escândalos financeiros e diplomáticos,
Agressões políticas nas ruas,
E de vez em quando o cometa dum regicídio
Que ilumina de Prodígio e Fanfarra os céus
Usuais e lúcidos da Civilização quotidiana!

Notícias desmentidas dos jornais,
Artigos políticos insinceramente sinceros,
Notícias passez à-la-caisse, grandes crimes -
Duas colunas deles passando para a segunda página!
O cheiro fresco a tinta de tipografia!
Os cartazes postos há pouco, molhados!
Vients-de-paraître amarelos como uma cinta branca!
Como eu vos amo a todos, a todos, a todos,
Como eu vos amo de todas as maneiras,
Com os olhos e com os ouvidos e com o olfacto
E com o tacto (o que palpar-vos representa para mim!)
E com a inteligência como uma antena que fazeis vibrar!
Ah, como todos os meus sentidos têm cio de vós!

Adubos, debulhadoras a vapor, progressos da agricultura!
Química agrícola, e o comércio quase uma ciência!
Ó mostruários dos caixeiros-viajantes,
Dos caixeiros-viajantes, cavaleiros-andantes da Indústria,
Prolongamentos humanos das fábricas e dos calmos escritórios!

Ó fazendas nas montras! Ó manequins! Ó últimos figurinos!
Ó artigos inúteis que toda a gente quer comprar!
Olá grandes armazéns com várias secções!
Olá anúncios eléctricos que vêm e estão e desaparecem!
Olá tudo com que hoje se constrói, com que hoje se é diferente de ontem!
Eh, cimento armado, beton de cimento, novos processos!
Progressos dos armamentos gloriosamente mortíferos!
Couraças, canhões, metralhadoras, submarinos, aeroplanos!
Amo-vos a todos, a tudo, como uma fera.
Amo-vos carnivoramente.
Pervertidamente e enroscando a minha vista
Em vós, ó coisas grandes, banais, úteis, inúteis,
Ó coisas todas modernas,
Ó minhas contemporâneas, forma actual e próxima
Do sistema imediato do Universo!
Nova Revelação metálica e dinâmica de Deus!

Ó fábricas, ó laboratórios, ó music-halls, ó Luna-Parks,
Ó couraçados, ó pontes, ó docas flutuantes -
Na minha mente turbulenta e encandescida
Possuo-vos como a uma mulher bela,
Completamente vos possuo como a uma mulher bela que não se ama,
Que se encontra casualmente e se acha interessantíssima.

Eh-lá-hô fachadas das grandes lojas!
Eh-lá-hô elevadores dos grandes edifícios!
Eh-lá-hô recomposições ministeriais!
Parlamentos, políticas, relatores de orçamentos,
Orçamentos falsificados!
(Um orçamento é tão natural como uma árvore
E um parlamento tão belo como uma borboleta).

Eh-lá o interesse por tudo na vida,
Porque tudo é a vida, desde os brilhantes nas montras
Até à noite ponte misteriosa entre os astros
E o mar antigo e solene, lavando as costas
E sendo misericordiosamente o mesmo
Que era quando Platão era realmente Platão
Na sua presença real e na sua carne com a alma dentro,
E falava com Aristóteles, que havia de não ser discípulo dele.

Eu podia morrer triturado por um motor
Com o sentimento de deliciosa entrega duma mulher possuída.
Atirem-me para dentro das fornalhas!
Metam-me debaixo dos comboios!
Espanquem-me a bordo de navios!
Masoquismo através de maquinismos!
Sadismo de não sei quê moderno e eu e barulho!

Up-lá hô jockey que ganhaste o Derby,
Morder entre dentes o teu cap de duas cores!

(Ser tão alto que não pudesse entrar por nenhuma porta!
Ah, olhar é em mim uma perversão sexual!)

Eh-lá, eh-lá, eh-lá, catedrais!
Deixai-me partir a cabeça de encontro às vossas esquinas.

E ser levado da rua cheio de sangue
Sem ninguém saber quem eu sou!

Ó tramways, funiculares, metropolitanos,
Roçai-vos por mim até ao espasmo!
Hilla! hilla! hilla-hô!
Dai-me gargalhadas em plena cara,
Ó automóveis apinhados de pândegos e de...,
Ó multidões quotidianas nem alegres nem tristes das ruas,
Rio multicolor anónimo e onde eu me posso banhar como quereria!
Ah, que vidas complexas, que coisas lá pelas casas de tudo isto!
Ah, saber-lhes as vidas a todos, as dificuldades de dinheiro,
As dissensões domésticas, os deboches que não se suspeitam,
Os pensamentos que cada um tem a sós consigo no seu quarto
E os gestos que faz quando ninguém pode ver!
Não saber tudo isto é ignorar tudo, ó raiva,
Ó raiva que como uma febre e um cio e uma fome
Me põe a magro o rosto e me agita às vezes as mãos
Em crispações absurdas em pleno meio das turbas
Nas ruas cheias de encontrões!

Ah, e a gente ordinária e suja, que parece sempre a mesma,
Que emprega palavrões como palavras usuais,
Cujos filhos roubam às portas das mercearias
E cujas filhas aos oito anos - e eu acho isto belo e amo-o! -
Masturbam homens de aspecto decente nos vãos de escada.
A gentalha que anda pelos andaimes e que vai para casa
Por vielas quase irreais de estreiteza e podridão.
Maravilhosamente gente humana que vive como os cães
Que está abaixo de todos os sistemas morais,
Para quem nenhuma religião foi feita,
Nenhuma arte criada,
Nenhuma política destinada para eles!
Como eu vos amo a todos, porque sois assim,
Nem imorais de tão baixos que sois, nem bons nem maus,
Inatingíveis por todos os progressos,
Fauna maravilhosa do fundo do mar da vida!

(Na nora do quintal da minha casa
O burro anda à roda, anda à roda,
E o mistério do mundo é do tamanho disto.
Limpa o suor com o braço, trabalhador descontente.
A luz do sol abafa o silêncio das esferas
E havemos todos de morrer,
Ó pinheirais sombrios ao crepúsculo,
Pinheirais onde a minha infância era outra coisa
Do que eu sou hoje...)

Mas, ah outra vez a raiva mecânica constante!
Outra vez a obsessão movimentada dos ónibus.
E outra vez a fúria de estar indo ao mesmo tempo dentro de todos os comboios
De todas as partes do mundo,
De estar dizendo adeus de bordo de todos os navios,
Que a estas horas estão levantando ferro ou afastando-se das docas.
Ó ferro, ó aço, ó alumínio, ó chapas de ferro ondulado!
Ó cais, ó portos, ó comboios, ó guindastes, ó rebocadores!

Eh-lá grandes desastres de comboios!
Eh-lá desabamentos de galerias de minas!
Eh-lá naufrágios deliciosos dos grandes transatlânticos!
Eh-lá-hô revoluções aqui, ali, acolá,
Alterações de constituições, guerras, tratados, invasões,
Ruído, injustiças, violências, e talvez para breve o fim,
A grande invasão dos bárbaros amarelos pela Europa,
E outro Sol no novo Horizonte!

Que importa tudo isto, mas que importa tudo isto
Ao fúlgido e rubro ruído contemporâneo,
Ao ruído cruel e delicioso da civilização de hoje?
Tudo isso apaga tudo, salvo o Momento,
O Momento de tronco nu e quente como um fogueiro,
O Momento estridentemente ruidoso e mecânico,
O Momento dinâmico passagem de todas as bacantes
Do ferro e do bronze e da bebedeira dos metais.

Eia comboios, eia pontes, eia hotéis à hora do jantar,
Eia aparelhos de todas as espécies, férreos, brutos, mínimos,
Instrumentos de precisão, aparelhos de triturar, de cavar,
Engenhos brocas, máquinas rotativas!

Eia! eia! eia!
Eia electricidade, nervos doentes da Matéria!
Eia telegrafia-sem-fios, simpatia metálica do Inconsciente!
Eia túneis, eia canais, Panamá, Kiel, Suez!
Eia todo o passado dentro do presente!
Eia todo o futuro já dentro de nós! eia!
Eia! eia! eia!
Frutos de ferro e útil da árvore-fábrica cosmopolita!
Eia! eia! eia! eia-hô-ô-ô!
Nem sei que existo para dentro. Giro, rodeio, engenho-me.
Engatam-me em todos os comboios.
Içam-me em todos os cais.
Giro dentro das hélices de todos os navios.
Eia! eia-hô! eia!
Eia! sou o calor mecânico e a electricidade!

Eia! e os rails e as casas de máquinas e a Europa!
Eia e hurrah por mim-tudo e tudo, máquinas a trabalhar, eia!

Galgar com tudo por cima de tudo! Hup-lá!

Hup-lá, hup-lá, hup-lá-hô, hup-lá!
Hé-la! He-hô! H-o-o-o-o!
Z-z-z-z-z-z-z-z-z-z-z-z!

Ah não ser eu toda a gente e toda a parte!

Fonte: Na Ponta da Língua

sexta-feira, 22 de abril de 2011

Minha busca vã

Ao rouxinol que canta
Na noite que vai caindo
Marcado de triste dor,
Às nuvens que vão subindo
Em matizes d'esplendor,
Eu peço notícias de ti.

Ao vento que vai passando
À brisa que vem chegando,
Ao odor do mar e da flor,
Ao canto das praias varridas
Pelas ondas irritadas,
Eu peço notícias de ti.

Às gaivotas que vão deixando
Pelo ar, um risco branco,
Ao rumor leve dos buzios,
Às mil e uma coisas da terra,
Eu peço notícias de ti.

Aos homens que vêm chegando,
Aos barcos, às fontes, aos rios,
Às estrelas que vão brilhando
Em risos, em frio desdém,
Eu peço notícias de ti.

Ninguém mas dá!
Só a chuva sobre mim em pranto se cerra.
Há silêncio em toda a terra,
Silêncio seco e ruim
De ventos vergando ramos
Como se dentro de mim
O mesmo silêncio se vaze.
Não há notícias de ti!

E neste anseio cansado
Nesta pergunta tão vã
Apenas queria (vê lá)...
Ser nuvem, ser ave, ter asas,
Ter algo mais do que sonhos,
Do que cantos, do que versos,
P'ra que pudesse voar
E poder assim saber,
Algo de ti, meu amor.

Fonte: Página do Facebook de Vera Lúcia

terça-feira, 19 de abril de 2011

Non posso eu, meu amigo

--- Non posso eu, meu amigo,
con vossa soidade
viver, ben vo-lo digo;
e por esto morade,
amigo, u mi possades
falar e me vejades.

Non posso u vos non vejo
viver, ben o creede,
tan muito vos desejo;
e por esto vivede,
amigo, u mi possades
falar e me vejades.

Nasci em forte ponto;
e, amigo, partide
o meu gran mal sen conto,
e por esto guaride,
amigo, u mi possades
falar e me vejades.

--- Guarrei, ben o creades,
senhor, u me mandades.

Fonte: site astormentas.com

Oda a las cosas

AMO las cosas loca,
locamente.
Me gustan las tenazas,
las tijeras,
adoro
las tazas,
las argollas,
las soperas,
sin hablar, por supuesto,
del sombrero.

Amo
todas las cosas,
no sólo
las supremas,
sino
las
infinita-
mente
chicas,
el dedal,
las espuelas,
los platos,
los floreros.

Ay, alma mía,
hermoso
es el planeta,
lleno
de pipas
por la mano
conducidas
en el humo,
de llaves,
de saleros,
en fin,
todo
lo que se hizo
por la mano del hombre, toda cosa:
las curvas del zapato,
el tejido,
el nuevo nacimiento
del oro
sin la sangre,
los anteojos,
los clavos,
las escobas,
los relojes, las brújulas,
las monedas, la suave
suavidad de las sillas.

Ay cuántas
cosas
puras
ha construido
el hombre:
de lana,
de madera,
de cristal,
de cordeles,
mesas
maravillosas,
navíos, escaleras.

Amo
todas
las cosas,
no porque sean
ardientes
o fragantes,
sino porque
no sé,
porque
este océano es el tuyo,
es el mío:
los botones,
las ruedas,
los pequeños
tesoros
olvidados,
los abanicos en
cuyos plumajes
desvaneció el amor
sus azahares,
las copas, los cuchillos,
las tijeras,
todo tiene
en el mango, en el contorno,
la huella
de unos dedos,
de una remota mano
perdida
en lo más olvidado del olvido.

Yo voy por casas,
calles,
ascensores,
tocando cosas,
divisando objetos
que en secreto ambiciono:
uno porque repica,
otro porque
es tan suave
como la suavidad de una cadera,
otro por su color de agua profunda,
otro por su espesor de terciopelo.

Oh río
irrevocable
de las cosas,
no se dirá
que sólo
amé
los peces,
o las plantas de selva y de pradera,
que no sólo
amé
lo que salta, sube, sobrevive, suspira.
No es verdad:
muchas cosas
me lo dijeron todo.
No sólo me tocaron
o las tocó mi mano,
sino que acompañaron
de tal modo
mi existencia
que conmigo existieron
y fueron para mí tan existentes
que vivieron conmigo media vida
y morirán conmigo media muerte.

Fonte: Neruda - página na net

segunda-feira, 7 de março de 2011

O Senhor Administrador


Balalaika amarela com bolsos largos,
Mangas compridas abotoadas,
Calção curto ou calça de perna longa,
Boné claro com emblema da Nação,
Cinturão largo e verde, fivela grande.
Botas pretas da tropa antiga
Sempre engraxadas
Sem grama de pó ou lama das picadas.

Atende sempre quem o procura.
Fazedor de estradas e de pontes de madeira
É médico, é enfermeiro,
É sacerdote, é correio,
É professor de leituras, de agricultura,
É juiz de makas
Conde, Marquês de um território
Que é metade do Puto,
Cabeça da Pátria-Sonho
Que a todos irmana.

Com um misto de realeza
Como um soba grande
Em pose de Império
Vai todo de amarelo
O Senhor Administrador.

Rui Moio, realizado a 25Fev2011 no Moby Caffé, em Odivelas

domingo, 6 de março de 2011

"A Estrela da Manhã" de Manuel Bandeira e "O Agente da Passiva" de Ernesto Lara Filho

A estrela da manhã (de Manuel Bandeira)


Eu quero a estrela da manhã
Onde está a estrela da manhã?
Meus amigos, meus inimigos
Procurem a estrela da manhã.

Ela desapareceu, ia nua.
Desapareceu com quem?
Procurem por toda a parte.

O agente da passiva (de Ernesto Lara Filho)

Eu quero o agente da passiva
Onde está o agente da Passiva?
Meus amigos, meus inimigos
Procurem o agente da passiva.

Ele desapareceu, ia nu
Desapareceu com quem?
Procurem por toda a parte.


Ernesto Lara Filho, in Crónicas da Roda Gigante, pág. 60.

Regresso

Nota Pessoal
Ernesto Lara Filho, o autor deste poema, no verso "Quando voltares" refere-se à sua irmã Alda Lara que se encontrava na Metrópole a estudar medicina.
Rui Moio

 Um dia,
Quando voltares, não mais encontrarás à tua espera
a nossa casinha de adobe
da rua principal.

Quando voltares
da Europa, irmã,
hás-de ver ainda
como a cidade mudou…

(Lembras-te das promessas
que fizemos?)

Quando voltares
Não mais encontrarás poesia no quintalão do Zé Guerra
agora transformado
atravessado
assassinado
por uma avenida transversal.

Quando voltares
só terás
Como o deixaste
O Mercado Municipal.

Não mais o Candeeiro
nem a velha lavadeira
O Frederico
esse agora é pintor
do Morais Pontes.

Nem as acácias rubras
hão-de florir
para ti
quando voltares.

“Lembras-te da palmeira
do quintal?
Foi abaixo com duas machadas
No tronco…”

Um dia
quando voltares
Não mais encontrarás
a Benguela que conhecestes
menina ainda
e que aprendeste a amar.

O velho João Correia?
Já morreu…

Quando voltares, afinal
não mais encontrarás à tua espera
a nossa casinha de adobe
da rua principal.

Ernesto Lara Filho, in Crónicas da Roda Gigante, págs 138 a 140.

quarta-feira, 2 de março de 2011

Carta de Um Contratado de António Jacinto (declamação de José Ramos)

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Mocidade – Sentido!


Mocidade – Sentido! É grande a herança
Que o génio português a vós confia (1)
Por bem a defender, dia a dia,
Ergui o vosso escudo e a vossa lança!
Com alma, com orgulho, com nobreza,
Foi ganha palmo a palmo, entre canseiras,
Ao sol de mil batalhas altaneiras!
Sentido, mocidade portuguesa!

Se em Cazengo, tal como no Minho,
E, no Planalto, como em Trás-os-Montes,
Nós ouvimos cantar as mesmas fontes
E sentimos por todas igual carinho;
Se lá no Seles, como no Alentejo,
O mesmo sol trespassa o nosso abrigo,
Fecunda a Terra, amadurece o trigo
E promete fartura de sobejo
-Porque teimar na ideia deshumana
De distinguirmos, sempre, em pensamento,
O que não é senão prolongamento
Desta pequena casa lusitana?

Portugal é só um! O essencial
Para que ele progrida é que se expanda!
Residir em Lisboa ou em Luanda
É tudo residir em Portugal!
Amemos essas terras de além-mar,
Rosário de altos feitos e milagres,
Que começou a ser rezado em Sagres
E que ainda tem muito que rezar!

Mocidade – Sentido! È grande a herança
Que o génio português a vós confia:
Por bem a defender, dia a dia,
Erguei o vosso escudo e a vossa lança!
Com alma, com orgulho, como nobreza,
Foi ganha palmo a palmo, entre canseiras,
Al sol de mil batalhas, altaneiras!
Sentido, mocidade protuguesa!


Nota: No original:”vos aforia”.
Fonte: Silva Tavares, in Pela Fé e pelo Império

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Que parva que sou (Deolinda)



Que parva que sou

Sou da geração sem remuneração
e não me incomoda esta condição.
Que parva que eu sou!

Porque isto está mal e vai continuar,
já é uma sorte eu poder estagiar.
Parva que eu sou!

E fico a pensar,
que mundo tão parvo
onde para ser escravo é preciso estudar.

Sou da geração 'casinha dos pais',
se já tenho tudo, pra quê querer mais?
Que parva que eu sou

Filhos, maridos, estou sempre a adiar
e ainda me falta o carro pagar
Que parva que eu sou!

E fico a pensar,
que mundo tão parvo
onde para ser escravo é preciso estudar.

Sou da geração 'vou queixar-me pra quê?'
Há alguém bem pior do que eu na TV.
Que parva que eu sou!

Sou da geração 'eu já não posso mais!'
que esta situação dura há tempo demais
E parva não sou!

E fico a pensar,
que mundo tão parvo
onde para ser escravo é preciso estudar

Fonte. DiarioLiberdade - post de 30Jan2011

Besos

Hay besos que pronuncian por sí solos
la sentencia de amor condenatoria,
hay besos que se dan con la mirada
hay besos que se dan con la memoria.

Hay besos silenciosos, besos nobles
hay besos enigmáticos, sinceros
hay besos que se dan sólo las almas
hay besos por prohibidos, verdaderos.

Hay besos que calcinan y que hieren,
hay besos que arrebatan los sentidos,
hay besos misteriosos que han dejado
mil sueños errantes y perdidos.

Hay besos problemáticos que encierran
una clave que nadie ha descifrado,
hay besos que engendran la tragedia
cuantas rosas en broche han deshojado.

Hay besos perfumados, besos tibios
que palpitan en íntimos anhelos,
hay besos que en los labios dejan huellas
como un campo de sol entre dos hielos.

Hay besos que parecen azucenas
por sublimes, ingenuos y por puros,
hay besos traicioneros y cobardes,
hay besos maldecidos y perjuros.

Judas besa a Jesús y deja impresa
en su rostro de Dios, la felonía,
mientras la Magdalena con sus besos
fortifica piadosa su agonía.

Desde entonces en los besos palpita
el amor, la traición y los dolores,
en las bodas humanas se parecen
a la brisa que juega con las flores.

Hay besos que producen desvaríos
de amorosa pasión ardiente y loca,
tú los conoces bien son besos míos
inventados por mí, para tu boca.

Besos de llama que en rastro impreso
llevan los surcos de un amor vedado,
besos de tempestad, salvajes besos
que solo nuestros labios han probado.

¿Te acuerdas del primero...? Indefinible;
cubrió tu faz de cárdenos sonrojos
y en los espasmos de emoción terrible,
llenaron sé de lágrimas tus ojos.

¿Te acuerdas que una tarde en loco exceso
te vi celoso imaginando agravios,
te suspendí en mis brazos... vibró un beso,
y qué viste después...? Sangre en mis labios.

Yo te enseñe a besar: los besos fríos
son de impasible corazón de roca,
yo te enseñé a besar con besos míos
inventados por mí, para tu boca.

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